quarta-feira, 30 de junho de 2010

Projecto Vénus



Texto e fotografia Dina Cristo

Os mentores do Projecto Vénus, Jacque Fresco e Roxanne Meadows, vêm este Sábado a Portugal, dar uma palestra, às 15h, num hotel em Lisboa. A conferência, cuja entrada é de cerca de dezasseis euros para ajuda na recolha de fundos, insere-se numa digressão mundial de apresentação do plano para redesenhar a cultura actual e colocar a tecnologia ao serviço do bem-estar de todos.
O projecto parte do pressuposto de que a Terra abunda em recursos, que a sua gestão por «métodos monetários é obsoleta e contra-produtiva» e é possível, recorrendo a uma energia limpa e renovável, satisfazer as necessidades essenciais de cada ser humano, como as de alimentação, vestuário, habitação, saúde ou educação.
Esta orientação para a regeneração social e a solução de problemas, como o excesso de população mundial, o desemprego ou o declínio dos eco-sistemas, é apoiada pelo Movimento Zeitgeist, iniciado em 2008, na sequência do documentário Zeitgeist Addendum.
O movimento social conta com cerca de 40 representações internacionais, uma das quais em Portugal (em Aveiro, Lisboa e Porto), e mais de 400 mil membros, 700 dos quais portugueses. Junho foi um dos meses mais activos, com apresentações em Lisboa, Porto e Póvoa do Varzim.
«Já é tempo de acabarmos com todo o sofrimento desnecessário que existe por todo este mundo e criarmos uma nova sociedade em que todos os seres humanos, e não uma percentagem reduzida como acontece hoje em dia, possam desfrutar de um elevado padrão de qualidade de vida com todas as virtuosidades que uma civilização próspera tem a oferecer, o que pode ser realizado através da aplicação inteligente e humana da ciência e tecnologia» clarificou ao A&A Paulo Próspero, promotor da iniciativa.

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sexta-feira, 25 de junho de 2010

A Ciência da Polis III

Abordamos nesta terceira parte a sabedoria como pedra angular da construção da cidade ou do Estado.

Texto José Luís Maio fotografia Dina Cristo 

Desde a mais vetusta antiguidade que se debate a justeza dos argumentos apresentados pelos pensadores que se dedicaram à ciência da “polis”.
Se, de todas as formas de estado (timocracia, oligarquia, democracia e tirania) que, ciclicamente, definiram e exerceram as mais variadas políticas dos países do mundo, nenhuma foi capaz de se afirmar perante as suas concorrentes, isso deve-se a algo de realmente profundo e indelével, tanto no âmago das sociedades, como no de cada ser humano: nenhuma foi capaz de servir todos os cidadãos simultaneamente, isto é, de servir verdadeiramente. E, nos breves interstícios em que o poder foi exercido sabiamente, todos os cidadãos foram de facto beneficiados por ele, mesmo que disso não tivessem consciência imediata, pois tais “embaixadores” do espírito – que é unidade na diversidade – agiram de acordo com a Regra de Ouro do hinduísmo, do budismo, do judaísmo, do cristianismo, do islamismo, etc., “Faz aos outros o que gostarias que te fizessem a ti”, posteriormente actualizada por Immanuel Kant com o seu imperativo categórico: "... Age somente segundo uma máxima tal que possas querer ao mesmo tempo que se torne lei universal" (0), ou ainda de acordo com o ensinamento de Aiax, o Avatar de Síntese: “Ensinai como quem serve, servi como quem dá, dai como quem compartilha, compartilhai como quem festeja, festejai como quem consagra. E, assim, vivei como se o universo inteiro dependesse de cada um dos vossos gestos”(1).
A decadência global do “mundo ocidental”, ocorrida a partir da época clássica grega – por influência dos sofistas e demagogos – até à actualidade, acentuou-se quando o imperador romano Constantino I tornou o Cristianismo religião de Estado e, na sequência disso, a Igreja Católica dominou em absoluto a partir do século IV. E, aqui, vem a propósito e vale a pena lembrar o editorial da revista "Biosofia", nº28, intitulado “Pecados?”, da autoria de José Manuel Anacleto.
A partir do alastramento do império “cristão”, ou da civilização ocidental, todas as estruturas sociais, políticas, económicas e artísticas do mundo dito desenvolvido foram tolhidas pela Igreja e pela ignorância despótica de monarquias e repúblicas por ela dominadas. Como alguém disse, “cinco séculos antes de Cristo construiu-se o Partenon. Cinco séculos depois de Cristo não se sabia construir uma casa”. Isto é, salvo em ocasiões excepcionais, quem ocupou o vértice da pirâmide não foram os mais sábios e íntegros, mas sim a legião de ignorantes, fanáticos, astutos, demagogos e serviçais que, através do esmagamento do “espírito de unidade”, levou a cabo políticas nacionais e internacionais para proveito próprio e de uns poucos. O próprio conceito “religião” foi vituperado, pois o seu verdadeiro fim deveria ser o de “religare” – raiz latina da própria palavra –, isto é, religar ou reunificar a Humanidade através da multiplicidade e diversidade culturais, pois, como se sabe, “a Cultura cresce com a Consciência e reflecte-se na Civilização” (2).
A (des)educação
Os sábios, ou amigos (“filo”) da sabedoria (“sophia”), ou ainda, os filósofos verdadeiros, de todas as eras – cujo único e real desígnio era o “florescimento” e consolidação dos “alicerces” com que se edifica o Bem Comum – nunca deixaram de sublinhar a necessidade do progressivo e paulatino auto-conhecimento do ser humano. Pois este, se, de facto, se conhecesse:
1. responsabilizar-se-ia pelos seus próprios actos, em vez de os justificar com absurdos e incoerências, ou de os endossar ao bode expiatório mais conveniente;
2. sorriria das condenações eternas, na exacta medida com que consideramos injusta e desproporcionada a condenação à pena máxima de um faminto por furto de um alimento, ou à pena mínima de alguém por apropriação dolosa do produto do trabalho de toda uma vida de outrem;
3. jamais usaria títulos académicos ou posições políticas, económicas ou sociais para prestígio pessoal, mas antes para servir o bem comum, como retribuição aos seus concidadãos pelo contributo havido na sua formação;
4. acentuaria a sua natureza tolerante, compreensiva, fraterna e bondosa face à imaturidade e imperfeição humanas, jamais pactuando com a permissividade, com a cumplicidade e com a cobardia perante a astúcia e o erro premeditado, doloso, opressor e vingativo, pois a sua apurada capacidade intuitiva (búdica ou crística) permitir-lhe-ia discernir entre o bem e o mal.
A redução e a adulteração das “ofertas” pedagógicas que nos levam ao conhecimento, à sabedoria, à emancipação, à autonomia, ao discernimento e à libertação dos grilhões da ignorância, do obscurantismo e demais doenças da alma (ou consciência), enquadram-se perfeitamente na estratégia dos agentes do “caos” individual e social.
Vejamos apenas um exemplo. A Filosofia deixou de ser obrigatória no nosso sistema de ensino. Se, por um lado, é possível que alguns professores desta disciplina tão nobre e essencial tenham alguma responsabilidade no facto de ter perdido muito do esplendor e sublimidade que a caracterizam, por outro lado, não resta a menor dúvida de que o principal responsável é o obsoleto “edifício” educativo a que os estudantes logo no início têm sido submetidos.
A origem, ou identidade (Id+entidade, o ser profundo), de cada indivíduo, povo ou nação, é desde os tempos mais remotos o “porto de abrigo” que lhe dá o sentimento de pertença a algo superior (protector) e, portanto, lhe transmite segurança num mundo a todos os níveis desconhecido ou mesmo hostil. O fatal esquecimento do que somos e da nossa verdadeira natureza, que foi violenta e despoticamente segregada pela gangrena da insídia clerical a partir de Constantino, contribuiu para o fatal “virar de costas” próprio da estultícia destruidora do “dividir para reinar”.
A real Filosofia – que é, ao fim e ao cabo, toda a “tentativa intelectual (ou mental) de compreensão do universo”, estando o homem incluído neste universo (o microcosmos integrado no macrocosmos), ou ainda “a apreensão e a expressão da Verdade” – é parte indissociável do ser humano enquanto agente de investigação de todos os fenómenos da Natureza e das causas que lhes dão origem. A sua agonia – perpetrada durante séculos pela infâmia teológica, tanto com a cumplicidade político-partidária da sua guarda-avançada conservadora ou “direitista”, como da omissão e indiferença dos pseudo-revolucionários ou “esquerdistas” – agravou-se com o esvaziamento e esterilização das chamadas disciplinas sociais, científicas e tecnológicas. O espírito inquiridor de todo o indivíduo foi sendo gradualmente apagado pelas superficialidades imediatistas do homem produtor e do homem consumidor de bens perecíveis. Efectivamente, todo o conhecimento, seja científico, religioso, artístico, ou técnico, não progride sem o questionamento profundo que só o pensamento filosófico é capaz de estimular. Não existe absolutamente nada no universo, no céu e na terra, no macrocosmo e no microcosmo, que esteja isento das perguntas fundamentais “porquê?” e “para quê?”. Se o “como”, próprio do conhecimento técnico, tem levado a Humanidade a terríveis catástrofes individuais e colectivas, é porque tem sido desprovido dessa alma filosófica, que aglutina os seres humanos e a vida que os anima numa única Realidade.
Ao retirar-se ao Homem a ferramenta essencial para o surgimento, crescimento e maturação do seu pensamento racional, ou razão – condição sine qua non para a exteriorização da sua efectiva plenitude – manter-se-á ele, para sempre e irremediavelmente, reduzido à condição de escravo servil e de ovelha acéfala que durante séculos vagueou pelos cinco continentes, sob a “cobiça e na rudeza duma austera, apagada e vil tristeza”.
A (des)politização
De todos os sectores fundamentais para que a Humanidade avance rumo ao futuro sonhado por todas as consciências nobres, o primeiro em importância, a real pedra angular de todas as actividades edificadoras do cidadão “global”, é o da política. É o poder político que determina a vida dos seres humanos organizados em sociedade e, em última instância, é ele que condiciona os demais, inclusive o poder económico. A sua sujeição a este último levar-nos-á (como sempre nos levou no passado) ao caos, à anarquia, à obsoleta lei do mais forte (em bestialidade, ignorância, ignomínia e belicismo, não em virtude, amor, sabedoria e inteligência).
Vivemos num tempo de “grandes enfileiramentos, de grandes movimentações colectivas e trabalhos grupais e, por isso, os impulsos político-sociais, condicionantes que são das grandes massas, ganham especial relevância. As ideias, a proclamação e a sustentação dos direitos humanos, das liberdades dos cidadãos e do primado da justiça, o surgimento de importantíssimos países e a … reunificação de outros, a promoção dos chamados direitos económicos, sociais e culturais e a efectivação da santa obra da educação (com a consequente melhoria das condições de vida e elevação das capacidades perceptivas das massas humanas, o que constitui plataforma para mais altos voos), as variadas experiências de modelos político-económico-sociais em diferentes países e regiões, a concepção e o avanço prático de formas de cooperação multinacional que, revelando já uma visão internacionalista, são precursoras da futura Fraternidade (planetária) das Nações, constituem importantíssimos frutos do labor dos que servem nesta área…” (3).
A grande conquista da Humanidade – a integração das nações numa nova ordem internacional verdadeiramente democrática – colide frontalmente com os crescentemente insustentáveis interesses económico-políticos (e não político-económicos, pois os primeiros sucumbem sobre a pressão dos segundos) que insistem em continuar a reduzir os seres humanos a um novo tipo de escravos e a marionetas silenciadas.
Ora, temos perante nós o cenário desta vigorosa marcha colectiva e as correspondentes convulsões planetárias. O futuro, que já é presente – ou vice-versa –, está a criar tremendas e irreparáveis brechas nas “construções de areia” dos demagogos e sofistas, pois nelas está demonstrada a sua incapacidade criadora e beneficamente voluntariosa, assim como a sua indignidade ideológica, em unir as populações num grande projecto nacional/internacional (pois hoje já não é possível separar do Todo planetário as partes que O constituem).
Somente a consistência filosófico-científico-religiosa – nos seus indestrutíveis e reais fundamentos, como 1. a vontade espiritual, 2. o amor/sabedoria e 3. a inteligência criadora e activa, acumulados e comprovados ao longo dos séculos por tantos sábios anónimos (porque humildes, não servis) – permite o acesso ao poder legitimo, aquele que serve para elevar os cidadãos e dar-lhes a oportunidade de “serem em acto aquilo que sempre foram em potência”, isto é, a oportunidade de manifestarem no mundo visível a sua verdadeira natureza de homens e mulheres de incontestada e incontestável integridade e dignidade e, afinal, de Filhos do Divino, progénitos “d’Aquele Acerca do Qual Nada se Pode Dizer”.

(0)In Fundamentos da Metafísica dos Costumes, 1785 (1) In As Novas Escrituras, Vol. II, Centro Lusitano de Unificação Cultural, 1993, 2.ª edição, pág. 105). (2) Sementes do Jardim de Morya e Pérolas de Luz, do CLUC, semente 185. (3) In As Novas Escrituras, vol. II, Mensagens dos Avatares Invisíveis, Centro Lusitano de Unificação Cultural, 1993, 2.ª edição, págs. 15/6

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quarta-feira, 23 de junho de 2010

Utopia?

Há dez anos, um movimento de cidadãos congregou-se em prol de (maior) independência nas eleições para os municípios e Assembleia da República. Recordamo-lo pelo seu principal impulsionador.

Texto José Luís Maio fotografia Victor Hugo Cristo

As extraordinárias potencialidades humanas com que, todos, somos dotados jamais deixarão de alimentar o sonho, uma vez e num átimo refulgente – “aqui e agora” – projectado no consciente. É em momentos como esse que se dissipa o também humano cepticismo da impossibilidade da utopia, que a relega para as calendas gregas.


E quanto mais escarpada é essa escalada, quantos mais obstáculos são colocados nessa senda inelutável, tanto externa como interna, desde o começo dos tempos, tanto mais lúcida é a determinação, mais enérgica, a força e mais abrangente, o amor por tudo o que vive, se move e tem o seu ser na eternidade, mesmo que corrompido no existir igualmente inexorável e quantas vezes aviltado pela brutal, néscia e absurda insensibilidade.
Passados que são dez anos desses momentos entusiasmantes e vibrantes de uma energia inexcedível pois o pensamento já habitava o paraíso idealizado – a construção de uma sociedade por todos, não apenas por uns “predestinados” –, cabe-nos agora, um pouco mais depurados pelo vento ígneo e implacável da realidade, não só da crença ingénua na irresponsabilidade e na retórica inconsequente dos actores (não agentes) públicos, como igualmente dos miasmas4 que contaminam os corredores oficiais, fazer um balanço daquilo que, no alvor do terceiro milénio, ficou conhecido por “Movimento de Cidadãos”, um dos inúmeros grupos de portugueses que começavam a surgir no país, numa manifestação de desagrado e repúdio por práticas governativas, legislativas, judiciais e económico-financeiras.
Imaginarão, por certo, os leitores que tal ideia poderá ter surgido de fontes etéreas, inspiradoras de mitos e transcendências, como as que deram origem à República ou às Leis platónicas. Nada mais errado! Os fautores da iniciativa jamais abrigariam a pretensão – pelo menos nestes éons5 mais próximos – de atingir os elevados cumes do pensamento intuitivo do divino filósofo. A fonte foi muito mais terrena, pretensa e idealmente próxima dos cidadãos: Belém.
Não a Belém – Beit Lehem, literalmente “Casa do Pão” – de Jesus Cristo, o Menino-Rei, o Homem Perfeito, a Luz do mundo ocidental, mas aquela em que se instalam outros menos elevados “reizinhos”. Na época, a “humilde e discreta manjedoura”, ou antes, a residência do mais alto magistrado de Portugal era ocupada por Jorge Sampaio.
Tantos foram os apelos, as exortações, os incentivos à participação dos cidadãos na definição de políticas públicas, que dois dos seus atentos e solidários ouvintes decidiram actuar, trabalhando num texto a que foi dado o título de “Uma resposta ao apelo presidencial”.
Essa insistência presidencial pode ser inferida de um artigo do "Diário de Notícias" de, pasme-se, cinco anos mais tarde:
«Sampaio quer sistema eleitoral 'recalibrado'.
Por Francisco Almeida Leite, 26 de Novembro de 2005.
O Presidente da República, Jorge Sampaio, defendeu ontem uma "recalibragem dos sistemas eleitorais, de forma a garantir melhores condições de representatividade". Na abertura do seminário "Pensar a Democracia", que ontem decorreu no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, Sampaio mostrou-se favorável a "novas formas de participação dos cidadãos na definição das políticas públicas."
Para o Chefe de Estado, a democracia confronta-se neste momento com problemas como a "quase-submersão da agenda política por uma agenda mediática" condicionada muitas vezes pela "contabilidade das audiências". Isto para além de outro problema, muito enfatizado por Jorge Sampaio, que é a "coexistência, nem sempre pacífica, nas democracias reais, entre direitos civis e políticos, por um lado, e direitos sociais, por outro."
Numa altura em que há alguma contestação social em Portugal no sector público, militar ou entre os juízes – por causa de medidas tomadas pelo Governo –, Sampaio garantiu que "vale a pena insistir" que o "núcleo básico de direitos sociais é, hoje, consubstancial à democracia". E acrescentou que a "erosão generalizada de tais direitos" conduz a "formas extremas de apatia cívica”.»
Usando o vernáculo teológico, tivemos, durante nove ou mesmo dez longos anos, um Presidente da República transformado num vigoroso e incansável repetidor dessa sirénica ladainha acerca da imperiosa necessidade de uma efectiva participação dos cidadãos na construção do seu próprio futuro. Com tal conduta, tornou-se num fiel seguidor – por certo de forma inconsciente, dada a sua qualidade de convicto agnóstico – das regras da santa madre igreja católica apostólica romana.
Do mesmo modo que uma mentira não se transforma numa verdade mesmo que propalada biliões de vezes, ou retocada para ter uma aparência mais refinada, uma promessa eivada de intenções inconfessáveis (ou até sem qualquer intenção, o que certamente não é melhor) jamais se transformará em realidade. Antes pelo contrário, tem efeitos narcotizantes e conduzem os destinatários a um estado de torpor e de dependência, em vez de actuantes, partícipes, autónomos e solidários. De facto, não vemos nenhuma diferença entre estas duas instituições no que respeita à eficácia da sua retórica “salvífica”: ambas servem de intercessoras entre os paraísos celestiais e terrenos e os seus acólitos partidários. Para que serve tal papagueio? Ora, no nosso quotidiano político, chamamos republicanos, laicos e socialistas a exemplos destes.
Passemos então a essa resposta, longamente preparada a partir de finais de Junho de 2000 com a preciosa colaboração de amigos anónimos:
«UMA RESPOSTA AO APELO PRESIDENCIAL
I Nestes últimos tempos, o senhor Presidente da República tem exortado os cidadãos a influenciar e a intervir mais activamente nas decisões que os afectam, não só no seu quotidiano mais imediato mas, também, no seu futuro mais distante.
II Este apelo não pode deixar de sensibilizar todos aqueles que partilham da sua atenta e avisada preocupação, todos aqueles que, conhecendo a natureza humana nos seus aspectos nucleares ou essenciais, são tolerantes, fraternos ou bondosos para com todos os seus semelhantes que erram por fraqueza, ignorância ou outra limitação inerente à sua condição, mas não são permissivos, cúmplices ou cobardes perante o erro que essa mesma condição provoca.
III A exortação presidencial demonstra uma consciência lúcida, abrangente e cooperante e que, em obediência à marcha inexorável do progresso, vai crescendo em cada vez mais cidadãos anónimos, embora escasseie nas personalidades que se movem na esfera político-partidária, facto que não se pode deixar de se considerar insólito.
IV Os desafios e os problemas com que todos nos confrontamos são demasiados profundos (mas não complicados) e inter-activos para que a nossa classe política, ainda incapaz de abdicar de privilégios pessoais e corporativos, seja capaz de os prever, detectar, implantar e resolver ou eliminar. Falta-lhe o desapego emocional, a visão clara e penetrante e o sábio discernimento que lhe permitiriam distanciar-se dos envolvimentos classistas e reflectir sobre as verdadeiras causas que condicionam e estimulam a vida e o progresso colectivos e, a partir daí, encontrar soluções eficazes para o Bem Comum.
V Os sectores fundamentais da nossa vida – familiar e educacional, produtiva, sanitária, económica, “mediática”, cultural, política, jurídica e social – padecem de enfermidades gravíssimas e os portugueses correm o risco de submergir na lama da mediocridade, da incompetência e do egoísmo dos que se têm limitado a envolver-se e a esgotar-se em questiúnculas menores.
VI Além disso, é imperiosa e urgente a criação e cuidada preservação de um terreno – lares com pais conscientes e escolas com orientadores sábios – propício à sementeira e crescimento das virtudes e atributos que façam multiplicar o número de cidadãos solidários, realizados, responsáveis e livres.
VII Os exemplos (não rumores nem insinuações) que nos têm chegado da prática política e esferas adjacentes já ultrapassaram há muito (e em muito) as raias do opróbrio. A crescente repulsa que os portugueses têm manifestado pela classe política (que ocupa o último lugar de todas as actividades nacionais) e o aumento da abstenção nos actos eleitorais, são disso prova irrefutável.
VIII Algo tem que ser feito, e muito rapidamente, quando nas mentes dos cidadãos começa a ganhar forma e a dominar a ideia de que o edifício da Política é o último refúgio da ganância, do oportunismo, do ódio, da ignorância, da violência, da mediocridade, da vaidade e de todos os outros males que corroem e destroem os anseios mais legítimos dos portugueses.
IX Há que haver a corajosa determinação de se “nomear” personalidades de elevada estirpe, à altura de tomar decisões sábias, pioneiras e de vanguarda e de agir em nome de princípios e de valores de universalismo, de verdade e de justiça, em vez de imitar modelos estereotipados caducos e de reagir a iniciativas alheias e a pressões imediatistas.
X Para isso, são necessários muita coragem e humildade, um equilibrado senso de proporções e uma consciência esclarecida. Toda e qualquer construção sólida exige o empenho e a participação do maior número possível de mentes e vontades livres e humanistas, responsáveis e solidárias.
XI A verdadeira autoridade (a que não é imposta despótica e irracionalmente, aquela que é livremente aceite por cidadãos conscientes) só pode ser exercida por pessoas legitimadas pela sua honorabilidade, férrea determinação, visão superior, inclusiva e universal, grandeza de alma e equilíbrio interior, sentido lúcido de justiça, simplicidade, parcimónia, profundo idealismo, espírito de sacrifício em prol da Humanidade e uma real e comprovada sabedoria.
XII Evitar o excesso de partidarização da nossa vida pública é hoje, mais do que nunca, urgente e vital para que se estanque a grave hemorragia e exaustão das nossas melhores energias. Apesar de terem sido dados alguns passos muito tímidos nesse sentido e de o supra-partidarismo já poder ser uma realidade nos actos eleitorais para as freguesias, impõe-se idêntica decisão para os municípios e para a Assembleia da República. Urge trazer para o campo prático da nossa vida ideias, valores e métodos correctos, tais como os da cooperação e do trabalho de equipa, humilde e perseverante, os únicos capazes de congraçar os genuínos esforços e as capacidades de todos os portugueses.
XIII Grande parte dos actuais políticos partidários fingem desconhecer que também existem pessoas sábias, capazes de dar o seu melhor ao serviço do progresso, mas que detestam participar em disputas estéreis, que apenas servem para exacerbar o aspecto mais sombrio e nocivo dos protagonistas.
XIV Temos espíritos profundamente lúcidos, homens e mulheres reconhecidamente bons e sábios, acima dos jogos e interesses pessoais/partidários e não nos podemos dar ao luxo de continuar a desperdiçar potencial tão precioso. É isso que a maioria dos nossos concidadãos anseia, quando expressa a sua desilusão e desencanto pela situação actual e aspira à moralização e dignificação da actividade política em Portugal.
XV O nosso mais alto Magistrado, aquele que - e porque - nada deve aos aparelhos partidários, já deu um passo decisivo ao apelar aos cidadãos para exercerem e intensificarem conscientemente a sua participação cívica. Na sequência da sua intervenção, estaríamos, por certo, no bom caminho, se se avançasse, prática e resolutamente, nesta via de regeneração.
XVI Face ao colapso, à incapacidade, à falência e ao descrédito do sistema vigente, há razões de sobra para crer que uma iniciativa desta natureza (ou com espírito idêntico) iria merecer o melhor dos acolhimentos e aplausos e a mais entusiástica simpatia da grande maioria dos portugueses, tão “desgastados” mas ainda ansiosos por paz em todos os sectores da sua vida individual e colectiva.»
Ao elaborar uma espécie de manifesto como este, a nossa intenção era fazer desencadear um genuíno sentimento nacional de repúdio pelo que, já nessa altura, surgia aos olhos de todos de forma evidente. A degradação da ética politica, visível e com ampla repercussão no poder local6, e a utilização ilegítima e criminosa dos fundos comunitários, propiciadora da consequente restauração ostentosa do iníquo, decadente e ancilosado novo-riquismo, são dois simples exemplos dessa, esta sim, “pandémica” e imunda atmosfera, irrespirável para a regeneração de um país por reconstruir.
O estado de espírito dos autores do documento parecia repercutir a preocupação presidencial – que se via a braços com uma indecisa e frágil maioria parlamentar – e esta “agonia” vivida por Jorge Sampaio era por eles secreta e anonimamente partilhada.
Já tinham sido nomeados por mais de uma vez, em finais de 1970, entre 78 e 80, governos de iniciativa presidencial de António Ramalho Eanes, com Alfredo Nobre da Costa, Carlos Alberto da Mota Pinto e Maria de Lourdes Pintasilgo como primeiros-ministros, pelos quais não adviera nenhuma desgraça ao país nem aos cidadãos, antes pelo contrário.
E foi nessa linha de pensamento que se sugeriu isso mesmo a Belém, no ponto IX: «…“nomear” personalidades de elevada estirpe, à altura de tomar decisões sábias, pioneiras e de vanguarda e de agir em nome de princípios e de valores de universalismo, de verdade e de justiça…».
Como se pode ver no ponto XII, foram feitas idênticas propostas a nível autárquico e parlamentar: «…Apesar de terem sido dados alguns passos muito tímidos nesse sentido e de o supra-partidarismo já poder ser uma realidade nos actos eleitorais para as freguesias, impõe-se idêntica decisão para os municípios e para a Assembleia da República...».
E se, mesmo pesando as gravíssimas e chocantes permissividade, omissão e cumplicidade “corporativas” entre certos “independentes” e os aparelhos partidários, foi tomada essa decisão para as autarquias através, como se sabe, da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais, a Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, a inexistência de legislação para candidaturas independentes à Assembleia da República subsiste até hoje7.
Passada esta primeira fase (de elaboração do manifesto), tratou-se de fazer a sua divulgação entre as pessoas mais próximas e as das nossas relações e, a partir daí, paulatina e progressivamente, pelo método multiplicador – em que uma vela acende duas, duas acendem quatro, quatro acendem oito, etc. –, passámos a enviá-lo pelo correio para conhecidos mais distantes, dentro do país, na esperança de que, por esse processo, se conseguisse um número assinalável de adesões. O manifesto ia acompanhado de uma pequena nota explicativa e de um exemplar para recolha de assinaturas, que aqui se dão a conhecer:
«Prezado concidadão.
Este documento é de todos os que anseiam e lutam pelo despertar e exteriorização das melhores energias, vontades e capacidades abrigadas na Alma Portuguesa. E é por isso que é deles a autoria deste manifesto, pois a sua essência tem estado mais ou menos latente, mais ou menos expressa, nas suas consciências, não sendo, por isso, legítimo, a quem quer que seja, arrogar-se como seu proprietário ou autor.
Se, após a sua leitura, se identificar com o seu conteúdo e pretender que tenha o maior alcance e a máxima eficácia, a nível nacional, divulgue-o por todos os meios ao seu dispor, de forma a que se consiga obter um esmagador e convincente número de assinaturas, de preferência legíveis e identificáveis através do preenchimento da coluna respectiva da folha anexa, o que contribuirá para a elevação e dignificação da iniciativa.
A folha anexa que contém os espaços para as assinaturas deverá ser conservada em branco para que posteriormente possa ser fotocopiada para novas recolhas.
O objectivo desta acção será a remessa, a partir do maior número possível de pontos do país (aldeias, vilas e cidades), do texto acompanhado de todas as assinaturas recolhidas, para o seguinte destinatário:
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA PALÁCIO DE BELÉM Praça Afonso de Albuquerque 1300 Lisboa Para que não se verifique qualquer dispersão e o consequente esvaziamento desta iniciativa, é importante que o envio do manifesto e assinaturas seja feito em simultâneo em todo o país. Assim, sugere-se a sua remessa ao destinatário entre os dias 1 e 15 de Abril de 2001, escrevendo-se apenas no remetente (...)».
Esta iniciativa, iniciada em meados de 2000, teve como corolário o envio ao Presidente da República de uma carta de apresentação do movimento, que aqui reproduzimos na íntegra:
«Sua Excelência O Presidente da República Sr. Dr. Jorge Sampaio 23 de Março de 2001 ASSUNTO: O SURGIMENTO DO MOVIMENTO DE CIDADÃOS E OS SEUS OBJECTIVOS. Excelência,
Vimos por este meio dar-lhe a conhecer, de forma sucinta mas, esperamos, clara, a razão do aparecimento do MOVIMENTO DE CIDADÃOS e os fins a que se propõe.
Como Vossa Excelência poderá facilmente concluir pelo teor do manifesto “UMA RESPOSTA AO APELO PRESIDENCIAL”, que temos a honra de anexar a esta e que circula actualmente no território nacional para recolha de assinaturas e que, no período de 01 a 15 de Abril, pensamos que chegará, de diversos pontos do país, ao Palácio de Belém, o MOVIMENTO DE CIDADÃOS teve como factor impulsionador a exortação que o Senhor Presidente fez a todos os portugueses ao longo da sua magistratura.
Porque já há muito aprendemos que o mundo e a sociedade são o que todos nós queremos que sejam e porque os princípios, os valores e as ideias que nos norteiam na vida e por que nos batemos coincidem com os de Vossa Excelência, esse apelo teve em nós um profundo impacto. Após uma séria ponderação, entre os vários elementos deste pequeno grupo de cidadãos, acerca da pertinência, actualidade e, sobretudo, eficácia duma estrutura tão frágil como esta, decidimos levar à prática esta ideia, há cerca de nove meses, mais exactamente no dia 29 de Junho de 2000.
De facto, ser-nos-ia bastante difícil, perante a nossa própria consciência, continuar a assistir passivamente aos acontecimentos que têm ocorrido nestes últimos anos no nosso país e a percorrer o caminho em que fomos colocados, depois da exortação de Vossa Excelência, sem pelo menos tentar fazer algo para os prevenir ou alterar.
Quanto aos seus objectivos, este MOVIMENTO DE CIDADÃOS pretende modestamente contribuir para a criação e propiciação dos instrumentos e mecanismos para que emirja, se legitime e consolide a integridade, a força e a acção das mais competentes, dinâmicas, dignas e prestigiadas individualidades que personifiquem o ESPÍRITO do verdadeiro e responsável Serviço Público, do duradouro e equânime progresso económico, da elevação cultural e da coesão e consciência sociais, tão bem reflectido no discurso de tomada de posse de 09 de Março de Vossa Excelência.
No campo prático, ao longo de todas estas semanas, limitámo-nos a entrar em contacto com todos os amigos, bem como com pessoas que pensamos conhecer minimamente para termos à-vontade em lhes darmos a conhecer este projecto, a fim de que, se com ele se identificassem, pudessem partilhá-lo e divulgá-lo a todos aqueles com quem se relacionam, até englobar todo o país, na convicção de que tudo o que se encontra em sintonia e em harmonia com o ritmo do verdadeiro Progresso acabará por se concretizar.
Por esse motivo, ser-nos-á difícil, se não mesmo impossível, determinar o número de portugueses que subscreverão o manifesto e o farão chegar às mãos de Vossa Excelência. Mas também pensamos que este pormenor é irrelevante, pois a qualidade (o grau de consciência cívica) deverá sobrepor-se à quantidade (o número dos que possuem essa consciência), apesar de o ideal ser a união de ambos os factores, consecução que o Tempo e a Evolução se encarregarão de fazer coincidir.
Esta acção é indubitavelmente ínfima, em comparação com as ingentes e complexas, mas honrosas, tarefas que Portugal e os Portugueses têm à sua frente. Porém, acreditamos que, deste pequeno sonho, poderá nascer uma digna e elevada Realidade.
Senhor Presidente, caso pretenda ver esclarecidos alguns aspectos porventura menos claros desta iniciativa ou outros pontos que considere pertinentes, pomo-nos desde já ao inteiro dispor de Vossa Excelência para uma audiência que entenda conceder-nos.
Aproveitando esta oportunidade para lhe desejar os maiores êxitos na sua decisiva e nobre missão,
Atentamente nos subscrevemos, com a nossa mais elevada consideração (...)».
Desta carta jamais foi acusada a recepção. Silêncio idêntico mereceu a “audácia” de um conjunto de cidadãos que transformou os (fingidos) apelos do presidente Jorge Sampaio numa iniciativa de que nunca se soube o verdadeiro impacto na sociedade portuguesa, nem a quantas mãos chegou.
Não nos cabe a nós dizer se algum mérito ela teve, nem isso é relevante. O que verdadeiramente importou foi a autenticidade com que se interiorizou e deu corpo visível a um sentimento popular de amor pátrio e de rejeição ética e social pela apropriação e usurpação, por parte de personagens obscuros, medíocres e indignos, dos bens inerentes a uma democracia que se pretende saudável e digna.
Epílogo
Confrontados hoje com o mesmo problema – o da exclusividade ou monopólio dos partidos políticos na gestão da res publica, a coisa do povo8, e o de se saber até que ponto um conjunto de indivíduos, não arrebanhados pelo chefe (seja-nos perdoada a rudeza da expressão, mas, infelizmente, é isso que sucede na maioria dos casos da actual vida partidária), e por muito elevada e inquestionável, em termos técnicos e éticos, que seja a sua capacidade em representar e servir o povo a que pertencem, podem organizar-se num grande projecto nacional, transcendendo ilusórias barreiras pretensamente ideológicas – pensamos o seguinte:
Embora os partidos políticos tenham comportamentos inadmissíveis na nossa sociedade, o certo é que os responsáveis por isso são os seus dirigentes e as pessoas que gravitam à sua volta pelas piores razões – as mesmas que motivam os comportamentos dos chefes.
Assim, os partidos políticos – que deviam ser "parte" do todo nacional, daí o conceito "partido" como nós o entendemos –, em vez de contribuir para a construção de uma unidade maior, fazem exactamente o oposto: "partem", dilaceram, destroem essa unidade, esse TODO que é o país, não agem em prol da UNIDADE ATRAVÉS DA DIVERSIDADE, como acontece com a luz branca que é reflectida ou manifestada pelas sete cores através do prisma óptico.
Ora, a nossa triste situação não se deve à existência de partidos políticos, mas, antes, ao tipo de psicologia e ao nível de consciência que caracteriza os agentes políticos. Se os partidos terminassem, não acabaria esta mentalidade (ainda) maioritária que devasta o que de mais sublime possuem todos os cidadãos. Por exemplo, nenhum autarca, deputado, legislador, governante e dirigente público não se transmuta em termos de consciência pelo mero facto de sair de um partido político e fundar um movimento de cidadãos. A sua motivação é exactamente a mesma: servir-se dos cargos que ocupa para benefício pessoal, em vez de servir o povo nos cargos que ocupa.
Já há quase 2.500 anos Platão dizia que os realmente melhores (aristos) da polis não deviam demitir-se da responsabilidade de governar, sob pena de serem substituídos pelos piores e mais indignos. Não se trata, portanto, de algo novo!
A única solução é o surgimento de pessoas dotadas de consciência determinada, lúcida, sábia e compassiva. Ora, isso só acontecerá através de uma educação correcta.
O nosso empenhamento terá de passar por aí, pensamos. Se formos capazes de influenciar concidadãos dotados dessas características e com vontade de assumir um projecto desta natureza, isso será o bastante

1 Doutrina dos que afirmam que o homem não pode atingir a verdade absoluta. In Dicionário Priberam da Língua Portuguesa.
2 Do latim tardio utopia, palavra forjada por Thomas More para nomear uma ilha ideal em A Utopia, do grego ou-, não + grego tópos, ou, lugar. Ou país imaginário em que tudo está organizado de uma forma superior. Sistema ou plano que parece irrealizável. Idem. 3 Isto é, para nenhum momento no futuro. 4 Emanações morbíficas provenientes de substâncias orgânicas em decomposição. In Dicionário Priberam da Língua Portuguesa. 5 Éon, eão, eon ou ainda aeon significa, em termos latos, um enorme período de tempo, ou a eternidade. A palavra latina aeon, significa "para sempre". Ela é derivada do grego αιών (aión), em que um dos significados é "um período de existência" ou "vida". In Wikipédia. 6 A impunidade dos autarcas a contas com a justiça iniciara a edificação do seu condomínio privado, com um número crescente de candidatos à sua ocupação. 7 Não pode deixar de soar a estranho, contraditório e, em última análise, absurdo – na linha do cristão Tertuliano e da sua famosa máxima “creio porque é absurdo” – o facto de serem os membros de um órgão de soberania a decidir sobre matéria do seu próprio interesse. Deveria haver um outro órgão para esse fim. É, para não dizer pior, caricata a arrogância de alguns destes órgãos – como o governo ou o parlamento –, quando, com uma lastimável parcialidade, uma óbvia incoerência lógica e o desplante que tão bem se lhes conhece, acusam de “corporativos” os grupos profissionais que pretendem ver respeitados os seus direitos e interesses legítimos, enquanto, numa inequívoca demonstração de abuso de poder e, este sim, de ditatorial “corporativismo” colegial, estão isentos de dar satisfações a quem quer que seja. E não colhe a nefanda argumentação sofística da “eleição” popular quadrienal para se eximirem a uma prova de, no mínimo, seriedade intelectual e, para cidadãos mais exigentes, de magnanimidade. E, dado que muitos se dizem cristãos, seria bom que tivessem presente a parábola do Evangelho de Lucas, 6, 49: “E porque atentas tu no argueiro que está no olho do teu irmão e não reparas na trave que está no teu próprio olho?”. 8 Res publica é uma frase latina, composta de res + publica, significando literalmente a "coisa do povo". O termo normalmente refere-se a uma coisa que não é considerada propriedade privada, mas que é em vez disso mantida em conjunto por muitas pessoas. In Wikipéda.

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quarta-feira, 16 de junho de 2010

Refugiados


Às portas do Dia Mundial do Refugiado, abordamos o problema dos que continuam a fugir de casa, perseguidos e violentados, em risco de vida. Também em Portugal.


Texto Catarina Santos fotografia Dina Cristo


Desde o início do séc. XX o problema dos refugiados tornou-se numa preocupação da comunidade internacional, de modo que esta, devido a questões de humanização, começou a assumir responsabilidades na sua protecção e assistência.

O modelo da acção internacional a favor dos direitos dos refugiados ganhou forma pela Sociedade das Nações, mas só mais tarde adoptou acordos internacionais, nomeadamente na Convenção de 1951, relativa ao Estatuto dos Refugiados. Foi adoptada por uma Conferência das Nações Unidas de Plenipotenciários, em 28 de Julho daquele ano mas só entrou em vigor a 21 de Abril de 1954. Este instrumento internacional continha a definição geral das pessoas que deveriam ser consideradas como refugiados e do seu estatuto jurídico.
Posto isto, os refugiados passam a ser classificados por categorias conforme a sua origem nacional, o território que deixaram e a ausência de protecção diplomática por parte do país de origem. No seguimento desta lógica, surge o termo “refugiados estatutários” que determina as pessoas que, embora sendo pouco provável, possam pedir o reconhecimento do seu estatuto de refugiado. Hoje em dia o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, ACNUR, não só apoia e protege os refugiados e apátridas como também tem, cada vez mais, abrangido os deslocados internamente.

Refugiado (não) é...

Ser deslocado interno: apesar das razões serem as mesmas das dos refugiados, os deslocados internos não adquirem o estatuto de refugiado porque não deixaram o país de origem. É certo que também abandonaram as suas casas e, muitas vezes, perderam a família numa corrida pela vida. Seguem caminhos diferentes e acabam por ficar sozinhos, sem saber onde está o agregado familiar. Abandonam tudo porque, por exemplo, homens armados atacam as vilas onde moram, matando, roubando, violando e recrutando crianças soldado.
Os grupos rebeldes fazem com que os deslocados internos fujam mas estes não atravessam fronteiras. Por vezes, por causa de montanhas ou rios, que os impedem de rumar para mais longe; outras vezes querem fugir para perto na esperança de poder regressar.

Ser apátrida: apesar de parecer impossível, não o é. Ser apátrida é não ter Pátria, não se ser cidadão em nenhum Estado e, por isso, não ter um Governo que proteja. Como tal, é necessária a protecção internacional.

Ser requerente de asilo: para além das necessidades básicas como alimentos, água ou cuidados médicos, o refugiado necessita de obter asilo para refazer a sua vida. Porém, para tal, exige-se ser reconhecido como refugiado, ou seja, reunir as três condições: primeira, que no seu país de origem receava ser perseguido; segunda, que tem razões para esse receio e, finalmente, terceira, que na base dessa perseguição estava a sua raça, a sua nacionalidade, a sua filiação a determinado grupo social, a sua religião ou as suas opiniões políticas.

O processo continua junto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), ou outra autoridade policial que remeta para este local, onde é apresentado o pedido de asilo. É então que se torna “um requerente de asilo” e o Conselho Português para os Refugiados em Portugal e também o ACNUR (em Genebra), são alertados para este caso. Importa referir que, até esta fase, o requerente de asilo está ilegal (no país de acolhimento) como qualquer imigrante ilegal. A avaliação do pedido de asilo é feita pelo Ministério da Administração Interna e pode demorar de quatro meses a um ano (ou mais), dependendo de caso para caso.

Ser retornado: quando alguém é obrigado a fugir e a tornar-se refugiado, a sua prioridade passa a ser a tentativa de encontrar uma solução douradora para a sua situação. Nem que para tal tenha de procurar asilo num país estranho ou viver em condições precárias em campos de refugiados ou instituições criadas para esse efeito. O termo "retornado" indica que as pessoas regressaram ao seu país. Mas para tal acontecer, é necessário que as condições que originaram a fuga estejam totalmente solucionadas.

Há ainda confusão entre as definições de refugiados e imigrantes. Tal facto acontece, principalmente, porque as dificuldades de entrar num território seguro são cada vez mais, obrigando os refugiados a usar o mesmo método que os imigrantes ilegais. Assim surgem imensos fluxos mistos de migração que acabam por dificultar a distinção entre quem se encontra em dificuldade económica, e procura uma vida melhor num país mais desenvolvido, e entre quem vai à procura de liberdade e segurança. Posto isto compreende-se que o ACNUR afirme ser indispensável “criar mecanismos de acesso aos territórios e garantir que aqueles que têm efectivamente necessidade de protecção a encontrem.”


Ganhar consciência…


Desta forma, todas as pessoas que se sentem perseguidas - quer por motivos de raça, religião, nacionalidade, quer por pertença a certo grupo social ou por expressão de opiniões políticas - se encontram fora do seu país e que a ele não podem regressar sem arriscar prisão injusta, tortura, ou até a morte são, segundo as Nações Unidas, considerados refugiados.
Outras razões para que populações sejam obrigadas a fugir abandonando tudo, são as crises económicas ou até as tragédias naturais e ambientais. A Presidente da Direcção da Revista portuguesa da Amnistia Internacional, Lucília José Justino, adianta que: “Ao contrário do que se pensa, a maioria [das pessoas que estão nas situações acima referidas] não vai para a Europa, mas foge para os países mais próximos, normalmente, países pobres” e exemplifica dizendo que “(…) mais de 3 milhões de afegãos vivem no Paquistão e no Irão, mais de 1 milhão na Síria ou na Jordânia, mais de 1 milhão de zimbabueanos na África do Sul”.
Estas pessoas têm direito ao asilo, segundo a Convenção de 1951. Mas apesar desta concessão ser uma obrigação internacional dos Estados, a maioria dos refugiados muito dificilmente consegue ter condições de aceder à Europa e submeter o seu caso às autoridades. Desta forma, grande parte daqueles que vêem negado esse direito e são devolvidos aos seus países (ou impedidos de chegarem a bom porto), preferem sujeitar-se a “perder a vida na travessia, em barcos sem segurança e muitos morrem” . Para além disto estão sujeitos a passar grandes tormentos tais como a exploração, a descriminação, a ilegalidade, a prisão e a expulsão ou “a oportunidade de percorrer os imensos labirintos burocráticos montados”, sob o pretexto de os proteger, refere a mesma fonte.
Os Estados têm, naturalmente, de controlar as imigrações ilegais, de prevenir a segurança interna, de reprimir o crime internacional e ainda o tráfico de seres humanos, mas os “direitos humanos não podem ser violados em nome de xenofobia, da ignorância ou do medo”, afirma Lucília José Justino. Um exemplo a não seguir é a Itália de Berlusconi, em que o Parlamento aprovou um “pacote de segurança” que serve para que o Estado se esquive às suas obrigações internacionais, criminalizando a chamada imigração ilegal, incluindo a intervenção de milícias civis contra os “indesejáveis”.
Naquele caso, para além de multas (de cinco mil a dez mil euros), os indocumentados podem perder os direitos mais básicos, incluindo cuidados sociais, de saúde ou de educação”, afirma a Presidente da Direcção. Mas este comportamento é ainda evidente quando penaliza, acusando médicos de cumplicidade, caso não denunciem as situações de que tenham conhecimento no exercício das suas funções. Esta cumplicidade é também penalizada se se tratar de outras populações vulneráveis, tais como os ciganos.

Deveres portugueses

Em 2009 o tema do Dia Mundial foi: “Pessoas reais com necessidades reais”. Em declarações à agência Lusa, a Presidente da Direcção do Conselho Português para os Refugiados (CPR), Teresa Tito de Morais, afirmou que estas “vêm em busca de melhores condições de vida e nós temos de contribuir para lhes dizer que essa esperança não é ficção, é uma realidade que deve ser conseguida.” Mas o “espírito aberto e generoso” dos portugueses não é suficiente para combater as dificuldades, como referiu , “em termos legais e de oportunidades de trabalho ou acesso à habitação” pelas quais essas pessoas passam.
É nestas questões que o centro de acolhimento do CPR (que funciona na Bobadela, no concelho de Loures) ajuda no “acompanhamento próximo que lhes permita integrarem-se no nosso país” sendo que esta principal actividade passa por aulas de português, formação e encaminhamento para emprego, mas também para a legalização da situação de permanência no país, visto que são inúmeras as situações em que o regresso aos países de origem é sinónimo de morte. As pessoas que se encontram nestas condições podem beneficiar de “protecção humanitária” que é uma espécie de estatuto de refugiado provisório, sendo renovável a cada dois anos.
Para além destes, Portugal acolhe, desde 2006,refugiados em regime de reinstalação. Quer isto dizer que estas pessoas não podem ficar no primeiro país de acolhimento, sendo “redistribuídos” por outros países.
Também para Ângelo Ribeiro, um dos fundadores do CPR, Portugal tem tradição de acolhimento e considerando, essa, uma característica do povo, considera-o também “(…) compreensivo, hospitaleiro, simpático e humano para os que vêm de além fronteiras”. Estando Portugal integrado na União Europeia, o país subscreveu o Acordo de Schengen que visa "suprimir gradualmente os controlos nas fronteiras comuns e instaurar um regime de livre circulação para todos os nacionais dos Estados signatários, dos outros Estados da Comunidade ou de países terceiros". Assim, com a livre circulação de pessoas e bens, entre os membros da comunidade, se justifica o crescente número de candidatos a participantes.
Mas, para Ângelo Ribeiro, a oportunidade de asilo em Portugal parte, também, de “deveres especiais” que este país tem para com outros, nomeadamente, para com os de “expressão portuguesa”. Diz, “Se, outrora, [Portugal] retirou riquezas e poderio das antigas colónias de África e do Brasil terá de ter uma concepção humanista em relação a esses povos, dos quais retirou tanto rendimento e sacou riqueza durante séculos. Foram territórios que também souberam acolher os portugueses em várias ocasiões da nossa História. E é justo agora, como que uma reparação em relação ao que deles extraímos, mesmo que tenhamos dado algum contributo importante para o seu desenvolvimento. Mas a ideia de que milhões de portugueses, no decorrer das épocas, encontraram fortuna e prosperidade nessas terras, não pode nem deve ser desprezada.”
E apesar de Portugal ser um país de emigração, por razões económicas, políticas e religiosas, a verdade é que, Ângelo Ribeiro reconhece que, por vezes, é difícil distinguir o “direito ao asilo político, de asilo por razões humanitárias”. Refere que muitos dos candidatos a entrar em Portugal são “motivados por razões económicas”, por viverem mal nos países de origem, mas acrescenta que o asilo político, “e consequentemente estatuto de refugiado, só deve ser concedido àqueles que provêm de países totalitários, ou que vivem guerras civis, matando-se uns aos outros ou perseguidos pela polícia política, pelo partido único e pela censura – trilogia maldita que também os portugueses sofrem na pele.” Importa referir também que, para ser possível uma “visão humanística”, é necessário evitar a criação de um “sentimento de rejeição perante estrangeiros, que atinge exemplos de racismo e xenofobia” que, embora de forma subtil, ainda existe.
De acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, após um declínio no número de refugiados entre 2001 e 2005, verificou-se nos últimos dois anos um aumento significativo desta realidade. O relatório do ACNUR de 2007 aponta para um aumento de 9,9 para 11,4 milhões de refugiados sob o seu cuidado. Actualmente a agência fornece protecção ou ajuda a cerca de 13,7 milhões de refugiados, face aos 12,8 milhões registados em 2006.

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sexta-feira, 11 de junho de 2010

Conferências

Ao assinalar o nosso terceiro Verão editamos (a primeira parte de) alguns discursos públicos sobre diversos temas e em diferentes forma(to)s.

Selecção e fotografia Dina Cristo

Marshall McLuhan - Compreender os "media" (1979):





Tamera - Universidade de Verão (2010):



Marshall Rosenberg - Comunicação não violenta:






"Plano inclinado" - Educação em Portugal (2010):
Ropert Happé - Auto-confiança:
Alfredo Sfeir-Younis - Paz silenciosa (2007):   
Severn Suzuki - Ambiente e desenvolvimento (1992):
JESSEN, Gianna - Aborto (2008):
AVELINE, Carlos Cardoso - Meditação (2007):

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quarta-feira, 9 de junho de 2010

Missão nacional


Texto e fotografia Dina Cristo

Amanhã, Dia de Portugal, tem lugar no Museu da Música, em Benfica, o colóquio “A Missão de Portugal no Mundo” com sete oradores. Ao longo de todo o dia pretende-se questionar se resta uma alma genuinamente portuguesa, de natureza cosmopolita, com raízes no universalismo e solidariedade com todos os povos. O objectivo é apurar se “ainda temos valores fundamentais com os quais nos identifiquemos verdadeiramente”, e o que podemos fazer com isso, como refere Luís Resina, na página do “Jornal do Milénio”.
Da parte da manhã irão falar Paulo Borges, sobre a vocação universal do país, Fernando Albuquerque, sobre a fundação do reino, e Maria Flávia de Monsaraz, sobre a nação astrológica. À tarde será a vez de José Manuel Anes, sobre o Império do Espírito Santo, Miguel Real, sobre o futuro nacional, e Luís Resina - que organiza com Ana Proença - sobre os grandes ciclos. Depois de um intervalo para lanche, será a vez de Marco Rodrigues abordar os seus potenciais evolucionistas e revolucionários da Alma nacional. Após um período de perguntas haverá, no final, um concerto com o coro Ricercare. A entrada será 45 euros.

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quarta-feira, 2 de junho de 2010

Portugal SA


Num momento negocial da PT e de vulnerabilidade económico-financeira do país, editamos um artigo, publicado em Março de 1993, no jornal do Gabinete do INE Norte, "O INtEndido"

Texto Fernando Pinto Basto fotografia Dina Cristo


Nos últimos anos a ideologia neoliberalista preconizou para as empresas um modelo de custo-beneficio que seria o padrão único de medida da sua eficácia. Como são as multinacionais quem mais ordena neste sistema, os Estados foram-se, com maior ou menor descaramento, submetendo à sua lógica. Temos agora instalado no nosso país uma coligação de duas minorias (caso não se tivessem apercebido, só esta santa aliança lhes permite o cumprimento dos deveres conjugais assumidos no casamento com a Pátria) que vai tentando estabelecer uma governação baseada em lógicas empresariais, ainda assim longe do pretendido pela nata empresarial nacional; conforme se devem lembrar, 40 ilustres empresários foram entregar (em 1992) ao governo uma petição para que fossem acautelados os seus interesses que são - como todos sabemos os da Nação.
Que acto nobre! Que dignificante! Que nacionalismo exacerbado!
E no entanto, nesses signatários estava um empresário que meses antes tinha vendido a Telecel (lembram-se, uma empresa nacional com lucros?) à multinacional Vodafone. E assim nos tornámos patrocinadores do Manchester United e da Ferrari. Uau! Que bom fazer parte das vitórias do Beckham e do Schumacher! Está bem, dirão os mais cépticos, mas foi só um entre quarenta! Dou-lhes mais um exemplo: a recente venda de parte das acções de um banco nacional aos espanhóis do Santander partiu de livre e espontânea vontade de outro desses empresários.
Questionado sobre esta iniciativa, depois de ter sido um dos signatários da tal petição, a resposta foi, entre outras subtilezas: "subscrevi-a, mas não fui eu que a redigi".
Elucidativo do carácter moral e da ética empresarial que regem as grandes empresas nacionais. As tais que não conseguiram colocar um produto, uma marca que se impusesse com sucesso na Europa e no Mundo (o vinho do Porto não conta, pois estes ainda não eram nascidos e o seu comércio começou a ser feito por ...ingleses).
Nesta história das mil e uma noites, não há Ali-Bábá que nos valha. Com um discurso irresponsável de crise a cobrir todas as suas acções, o primeiro-ministro e os seus acólitos implementaram uma série de medidas draconianas para acabar com o suposto regabofe do governo precedente.
Escolhendo como alvo a Função Pública, trataram de a difamar primeiro aos olhos da opinião pública, para justificar depois todos os meios coercivos utilizados contra tais hereges, começando pela redução da despesa pública como primeva solução para não ultrapassar o sacrossanto défice.
Atente-se no seguinte facto: os trabalhadores da Administração Pública são mais de 600 mil e o Estado é o maior empregador dos recém-licenciados.
Com o congelamento de admissões decretado para este ano e seguintes, e a inevitável reforma de algumas dezenas de milhar de funcionários públicos por limite de idade, parece-me linear o descalabro que irá reinar nas mais diversas áreas do funcionalismo público nos próximos anos: administração local, educação, saúde, justiça, obras públicas, transportes ferroviários e por aí fora. Mas, nada de aflições antecipadas: o primeiro-ministro, homem alertado que é, esteve há uns meses nos Estados Unidos da América (país a quem - como se verificou recentemente - deve maior fidelidade do que a Portugal!) especificamente para convidar os empresários norte-americanos a investir em terras lusas pois "a mão-de-obra é barata" (sic). O nosso drama é que ainda existem melhores escravos (na Roménia, na Índia, nos países asiáticos) e as empresas estrangeiras, que cá estavam, estão a abandonar este oásis cada vez mais árido.
Agora que continua o emagrecimento de instituições onde se quer fazer crer que se tinha emprego remunerado mas não se trabalhava, também o I. N.E. começa a sentir os danos colaterais de tais medidas: não concretização do acordo de empresa, perda de autonomia financeira, não renovação de contratos a termo, diminuição dos prestadores de serviços, aumentos salariais liliputianos e um sentimento de conformismo que levaram à falta de solidariedade e intervenção quando era preciso demonstrar precisamente o oposto a quem nos tutela.
Mas era pedir demasiado a quem já tinha sido instilada uma porção de medo q.b. para não colocar em perigo o ordenado contado no fim do mês, o suficiente para se deixar extinguir uma Comissão de Trabalhadores. Agradecidos ficaram aqueles que ainda pensam poder tirar proveitos de uma instituição pública e das suas virtudes privadas, e uma força política que quando esteve no poder, em 1993, teve um ministro das Finanças a dizer que as estatísticas do INE não serviam para nada. E os seus funcionários, ainda servirão?.

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