quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Meio século de utopia


A paz e fraternidade entre a família europeia deixaram de ser apenas um ideal. Há 50 anos.

Texto e fotografia Dina Cristo

O primeiro dia do ano assinala nada mais do que a concretização do sonho europeu: a re-união da Europa. Inicialmente a seis, República Federal Alemã, França, Itália e os países do Benelux – Bélgica, Luxemburgo e Países Baixos colocaram em marcha um processo de unificação. No dia um de Janeiro de 1948 entrou em vigor o Tratado constitutivo da CEE – Comunidade Económica Europeia – que criou um Mercado Comum Europeu e abriu as fronteiras internas.
Este tratado criou algumas políticas, como a agrícola, a PAC – Política Agrícola Comum - e instituições comuns, como a Assembleia (actual Parlamento Europeu), Conselho de Ministros, Comissão, Tribunal de Justiça, Comité Económico e Social, Tribunal de Contas e Banco Europeu de Investimento. Na mesma altura foi também criada a Euratom, Comunidade Europeia de Energia Atómica, para aumentar a produção energética europeia.
O Tratado de Roma, assinado (por Antonio Segni, Christian Pineau,
Joseph Bech, Joseph Luns, Paul Henri Spaak e Konrad Adenauer) em Março de 1957, tinha como objectivo uma integração económica progressiva que atingisse uma união política, a criação de um mercado comum e o relançamento da economia. Estávamos na época do pós-Guerra, com toda a consequente destruição e enfraquecimento da Europa num contexto internacional de domínio dos EUA e da União Soviética. Os valores da fraternidade e da paz subjacentes à (re)construção europeia eram fundamentais.
Vividas as consequências da guerra, os homens entenderam que o melhor, para todos, seria a (re)união. E para preservar a paz, não bastava a cooperação internacional, havia que aprofundar, integrar, fundir os países. Primeiro em termos económicos, depois administrativos até à dimensão política. Nações até aí separadas integraram uma união maior, foram-se (e vão-se) tornando num só.
Eliminam-se as fronteiras, primeiro de bens, depois de pessoas. Hoje, qualquer cidadão - além dos países do núcleo duro, do Reino Unido, Irlanda e Dinamarca (que aderiram em 1973), Grécia (1981), Portugal e Espanha (1986), Áustria, Finlândia e Suécia (1995), Chipre, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Hungria, Letónia, Lituânia, Malta, Polónia e República Checa (2004) e Bulgária e Roménia (2007) - pode estudar, trabalhar e/ou viver nos outros países. A nossa identidade, experiência e percepção mudaram. Somos actualmente uma comunidade de 27 estados ou regiões de uma comunidade em edificação.
Tratados até Lisboa
O tratado fundador da união europeia teve os seus antecedentes, como a instituição da CECA – Comunidade Europeia do Carvão e do Aço – que durou precisamente meio século, de 23 de Julho de 1952 à mesma data em 2002, e haveria de ter vários consequentes.
O primeiro foi o chamado Tratado de Fusão, assinado em Bruxelas, e que, no final dos anos 60, instituiu uma Comissão e Conselho únicos para as comunidades então existentes (CECA, CEE e Euratom). Mais tarde, no final dos anos 80, entraram em vigor o Acto Único Europeu, que estabeleceu a União Económica e Monetária, e, no início dos anos 90, o Acordo fundador da União Europeia (UE), conhecido como Tratado de Maastricht, criando o Mercado Único e com pilares ao nível da justiça, assuntos internos e defesa, com a PESC – Política Externa de Segurança Comum (que havia fracassado, em 1954, com a tentativa de criação da CED – Comunidade Europeia de Defesa).
Em menos de dez anos (últimos), assinaram-se os Tratados de Amesterdão (com alterações aos anteriores), de Nice (com versão única dos acordos antecedentes e uma reforma institucional) e, em 2004, o Tratado de Roma II, estabelecendo uma Constituição Europeia - rejeitado, em 2005, pela França e Países Baixos. Por fim, o Tratado de Lisboa, assinado há menos de um mês, que altera o Tratado da UE e o que instituiu a CE – Comunidade Europeia (resultado da transformação da anterior CEE, no Tratado de 1993).
União fortalecida
Há cinco décadas que os políticos europeus, em vez de utilizarem estratégias militares, sentam-se às mesas, conversando, tentando encontrar uma unidade na diversidade, harmonizando diferenças, convergindo. Dirigentes europeus tentam pôr em prática aquilo que (n)os une: os valores – cooperação e solidariedade, liberdade e tolerância, Estado de Direito, democracia, direitos humanos. Tal, tem um preço: a cedência de parte da soberania dos Estados-Membros em relação a algumas competências.
Ninguém prometeu que seria fácil. Compatibilizar a prosperidade económica e o modelo social, convencer os homens de que a união faz a força, o alargamento da família só nos pode trazer mais paz e alegria, a fraternidade (a união da humanidade, escrita por Schiller, em 1785, e musicada por Beethoven, em 1823, sonhada por tantos génios da humanidade) concretiza-se, passo a passo. Oportunidade para escutar “Ode à Alegria”, Hino oficial dos estados unidos da Europa, desde 1985.

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