A suprema importância da educação na vida de qualquer país tem de estar na proporcionalidade directa da envergadura ética e profissional daqueles que devem levá-la a cabo, sejam os ideólogos (legisladores e governantes), sejam os executores (pais e professores).
Contrariamente à usualmente conhecida por Sabedoria das Idades, Eterna Sabedoria, ou Ciência Espiritual, que aguarda paciente e misericordiosamente o momento em que, assim o queiramos, galvanizará todo o formidável potencial que caracteriza o Ser Humano no seu mais excelso esplendor e na sua mais magnífica estatura, no seio sabiamente hierarquizado do Todo Universal – precisamente no centro da Cruz Cósmica da plenitude da Vida, entre os reinos sub-humanos (adormecidos para a Unidade Divina) e supra-humanos (despertos e activos nessa Unidade) –, impera ainda no mundo e nas nossas vidas o pretenso, vulgar, limitado e constrangedor saber humano (a “sabença” no dizer de António Sérgio), cujos frágeis e cada vez mais obsoletos pilares teimam em perpetuar a fraqueza (física), o medo (emocional) e a inépcia (mental) na comunidade das crianças, adolescentes, jovens, pais, educadores, professores e cidadãos em geral.
É óbvio que a repressão da energia de todo o potencial que caracteriza os seres humanos – desde o nível físico até ao nível espiritual – só poderá dar maus resultados, pois é impossível reprimir seja quem for indefinida e impunemente, até ao momento da sua morte, como nos demonstra uma vulgar panela cheia de água hermeticamente fechada, ao lume.
Aprendamos novamente com
Platão: “…São leis justas porquanto produzem o bem-estar daqueles que as utilizam proporcionando todas as coisas que são boas. Ora, os bens são de duas espécies, a saber, humanos e divinos; os bens humanos dependem dos divinos e aquele que recebe o maior bem adquire igualmente o menor, caso contrário é privado de ambos”.
“Entre os bens menores a saúde vem em primeiro lugar, a beleza em segundo, o vigor em terceiro, necessário à corrida e todos os demais exercícios corporais; segue-se o quarto bem, a riqueza, não a riqueza cega, mas a de visão aguda, que tem a sabedoria por companheira”.
“A sabedoria, a propósito, ocupa o primeiro lugar entre os bens que são divinos, vindo a racional moderação da alma [disposição moderadora da alma associada à inteligência; numa palavra, a temperança” (sobriedade)] “em segundo lugar; da união destas duas com a coragem nasce a justiça, ou seja, o terceiro bem divino, seguido pelo quarto, que é a coragem”.
De posse do conhecimento do que é nefasto e benéfico para as crianças, importa agora atentar para o facto de que se, conforme nos ensina Platão, “devido à força do hábito é na infância que todo o carácter é mais efectivamente determinado”, é mister estabelecer-se uma
sinopse de prioridades a instituir, de modo a que os “bens” gerais – “humanos e divinos” – floresçam naturalmente em todas as crianças, passando de “potenciais” (possíveis e invisíveis) a “actuais” (efectivos e visíveis).
Também na ciência da educação é a lei hermética e universal da analogia ou da correspondência tão bem aplicada, como, aliás, não podia deixar de ser, pois, a não ser assim, isto é, se não incluísse toda a realidade, tal lei jamais poderia ser tida por “universal”.
Basta um pouco de atenção (ou, mais exactamente, de interiorização ou aprofundamento do pensamento – coisa a que, infelizmente, não estamos muito habituados, dado o ritmo frenético de vida quotidiana que decidimos adoptar, e não só…) e, de acordo com essa lei, transpormos os fenómenos básicos e elementares de manifestações da vida – neste caso, o da gravidez da futura mãe, quando o nascituro carregado de vitalidade se agita e movimenta no ventre, e o início da existência fisicamente autónoma dos recém-nascidos, quando chora poderosamente – para a instituição generalizada de um conjunto de normas educativas correctas, neste caso referentes à ginástica e dança para o corpo e à música (que inclui o canto) para a alma.
Para tal, recorramos novamente a Platão e às suas Leis: “ –…A
nutrição correcta tem de ser decididamente capaz de tornar tanto corpos quanto almas em todos os aspectos os mais belos e melhores possíveis… E suponho que, tomando o mais elementar dos aspectos, os corpos mais belos devem, já da mais tenra infância, desenvolver-se com a maior normalidade possível… Acontece observarmos que, no que diz respeito a qualquer ser vivo, o primeiro impulso representa de muito o crescimento mais intenso e mais longo, a ponto de muitas pessoas afirmarem convictamente que, quanto à altura, os indivíduos crescem mais nos primeiros cinco anos de vida do que nos vinte seguintes. Mas nós sabemos que, quando o crescimento ocorre rapidamente desacompanhado de muito exercício adequado, produz no corpo males incontáveis. E que corpos que recebem o máximo de alimento requerem o máximo de exercício…
– O que queres dizer? Será que pretendemos prescrever o máximo de exercício para os recém-nascidos e as criancinhas?
– Não. Na verdade, bem antes disso. Nós prescrevê-lo-emos para aqueles que são nutridos nos corpos das suas mães… Uma tal prática é mais fácil de ser compreendida no meu Estado, porque lá há pessoas que praticam os jogos até ao excesso. Ali encontramos não apenas meninos mas por vezes mesmo homens velhos criando pequenas aves… Mas essas pessoas estão longe de crer que o adestramento que lhes proporcionam excitando a sua pugnacidade produz exercício suficiente; além disso, cada uma delas apanha a sua ave e com ela no punho, se for menor, ou no braço, se for maior, caminha muitos estádios a fim de melhorar a condição não dos seus próprios corpos, mas sim a desses animais. Assim se mostra claramente a qualquer observador que todos os corpos são beneficiados, como se por um tónico, quando são deslocados mediante qualquer tipo de movimento, seja quando são movidos por acção própria – como num balanço ou num barco a remo –, seja quando são transportados no dorso de um cavalo ou por quaisquer outros corpos de movimento célere; e também mostra que é esta a razão por que os corpos podem assimilar eficientemente os seus suprimentos alimentares e bebida e proporcionar-nos saúde, beleza e vigor… Tanto para o corpo quanto para as almas dos bebés um processo de nutrição infantil e movimentação, que seja o mais ininterrupto possível…, é sempre salutar e especialmente no caso dos bebés mais novos, que deveriam, se possível, ser balançados como se estivessem num navio; com os recém-nascidos dever-se-ia reproduzir esta condição com a máxima proximidade da condição original. Uma evidência suplementar a favor disto pode ser constatada no facto desse procedimento ser adoptado e a sua utilidade ser reconhecida tanto por quem alimenta os bebés, quanto por quem administra medicamentos. Assim, quando as mães têm filhos que padecem de insónia e desejam acalmá-los para que adormeçam, o tratamento que lhes dão não é imobilizá-los mas sim movê-los, pois embalam-nos nos seus braços constantemente; e em lugar de silêncio fazem uso de uma espécie de cantarolar e assim literalmente fascinam os seus bebés…, por meio do emprego do movimento combinado da dança e da canção como medicamento…”. Tal doença é uma forma de “medo e os medos devem-se a uma condição precária da alma. Assim, sempre que se aplica um sacudir externo a males desse tipo, este movimento externo aplicado domina o movimento (a perturbação) interno de medo e, ao dominá-lo produz uma visível tranquilidade na alma…”.