Para além de ir ou vir de férias, como a época que atravessamos, das mudanças profundas, ao nível climático, e superficiais, ao nível do penteado - expressão dessa força de vontade – há várias outras que abordamos a seguir.
Texto e fotografia Dina Cristo
Uns temem-na, outros desejam-na. Os pessimistas porque se fixam nos perigos, os optimistas porque acreditam nos benefícios. Como contou Spencer Johnson, no seu livro, os “pigarras” agarram-se ao medo, os “gaguinhos” à esperança.
Na vida, há os que tentam resistir à mudança e os que a tentam provocar, quer do ponto de vista individual quer colectivo. Os conservadores bloqueiam-na, os activistas incitam-na. Uns a favor da estabilidade, outros do dinamismo.
A mudança faz parte da vida. Tudo o que é vivo se movimenta, balança entre um pólo e o seu contrário. Uma acção que ou se faz em equilíbrio, moderadamente, quando se aceita a alternância, tão naturalmente como o dia e a noite, ou, sendo evitada, ocorrerá de forma abrupta, dada a necessidade de compensação. Sempre que se pende para um lado, mais cedo ou mais tarde, irá tender-se para outro; e não é pouco comum transformar-se mesmo no seu oposto, afinal duas faces da mesma moeda.
Tudo muda continuamente. A única constante na vida (relativa) é precisamente a mudança e a melhor forma de a enfrentar é preparar-se para ela, como se conclui do conto de “Quem mudou o meu queijo?”, e aceitá-la, sem a evitar ou antecipar. Os próprios padrões humanos (masculinos e femininos) também se vão alterando ao longo da vida, como explicou Jean Shinoda Bolen.
Sem obstrução, esta força limpará tudo o que já não serve e é, portanto, inútil à evolução pessoal e colectiva, abrindo espaço para o novo, a inovação e a criatividade. Do ponto de vista positivo pode ser experienciada, assim, com(o) entusiasmo, liberdade e alegria. Pelo contrário, se a ênfase é colocada no que se perde, na inércia, na resistência, no apego ao velho traz consigo sofrimento e, depois, doença.
Em termos verbais implica uma doação (mudar) e enquanto processo uma oscilação (mudança). Em ambos os casos, do ponto de vista numerológicos, representa o 21: o saber viver, o melhor possível, com o que se tem disponível, conforme a atitude de fluidez ou não o fazê-lo numa postura de resistência(1).
As diferentes perspectivas podem constatar-se desde quem prefere (in)conscientemente morrer a mudar às que mantêm, dentro do possível, um estilo de vida nómada, como os ciganos. Também ao nível sanguíneo, grupos como o tipo O têm maior facilidade de adaptação. Em termos numerológicos, o mesmo se pode dizer dos "nove", por conterem características de todos os outros números, e os que se encontram num ciclo "cinco", um dos mais propícios a mudanças relevantes.
A vida é dinamismo constante entre forças que se atraem e se repelam, entre fluxos e refluxos, inspirações e expirações. Desse balancear, o velho é “convidado” a sair para que o novo possa entrar. Em cada segundo. A toda a hora. É esta mudança contínua que permite a preservação do sistema, mais tarde visível em destruição (fim de ciclo), que dará lugar à (re)novação e à (re)recriação (em nova etapa).
Apesar de omnipresente, e fundamental nas passagens das diferentes fases da vida, do nascimento à morte, hoje quase sem rituais, este processo, que também é de desapego em relação ao passado, por vezes é difícil, ou porque foi bom – e se deseja reter – ou porque foi mau – e se culpa ou se sente culpado. Será mais fácil se houver não só preparação mas também precaução, para que não se elimine ou prescinda de tudo só porque é passado, como acontece nas revoluções, e se for enfrentado conscientemente e por vontade da própria pessoa, sem imposição, pressão ou manipulação exterior.
A mudança foi cantada por José Mário Branco e, mais recentemente, pelos “Humanos”. É hoje foco e nome de “medium”. Foi reflectida por autores como Gandhi – sê a mudança que queres ver no mundo -, Heráclito - ninguém se banha duas vezes na água do mesmo rio – ou, por exemplo, Lavoisier, nada se perde, nada se cria, tudo se transforma. Em Portugal, ficou célebre o manifesto anti-Dantas de Almada Negreiros.
O processo de mudança pode ser despoletado não só pela perda, ao nível da saúde, do trabalho, da família, por exemplo (caso em que a terapia floral aconselha o remédio Walnut), mas também pela insatisfação ou pelo erro. Nesta ocasião, é preciso tempo para reflectir e corrigir, alterar a direcção e, como nas curvas da vida, mesmo as físicas (umas mais apertadas, outras mais inclinadas), a visibilidade diminui. Aumenta o desconhecido e, por consequência, o medo e a angústia.
É preciso, pois, uma certa dose de coragem e confiança para o desafio que constitui enfrentar o incógnito, o diferente. Contudo, o risco está em não mudar, pois tal implica estagnar e, na prática, andar para trás. Como disse Omraam Aivanhov, “aqueles que se deixam ir atrás da facilidade, da preguiça, da estagnação, aproximam-se da vida instintiva, vegetativa, mineral, e petrificam-se”(2).
Como diz o provérbio português, “parar é morrer”, mas também “quem está mal, muda-se”. Se por um lado há tendência, pela lei da inércia, a prosseguir (n)o estado em que se está, para a contração, por outro também há um impulso evolutivo, para a expansão, e sem se descartar da pele velha, como acontece com os animais na muda, não haveria lugar à regeneração, ao renascimento.
Tolstoi chamava a atenção para a importância da mudança interior: “Todos pensam em mudar o mundo, mas ninguém pensa em mudar a si próprio”, afirmou. Ora esta transformação pessoal é condição para que a mudança no mundo exterior aconteça. Foi a conclusão no movimento hippie, nos anos 60, e é hoje explicada pelas novas teorias. Trata-se de uma decisão individual, confirmada a cada instante, que começa, antes de mais no pensamento.
Para que o comportamento se altere, de forma que não seja meramente superficial, artificial, momentânea e inconsciente, mas antes constituia uma atitude sustentável, mais profunda e construtiva é necessário começar pela transmutação mental própria, em detrimento da expectativa em relação às modificações físicas e exteriores. Como escreveu Johannes F. Hasenack, “a soma de muitas iniciativas, a partir de baixo, e de novas atitudes a partir de dentro, bem pode desencadear um processo de mudança no todo ao qual pertencemos”.
Novo paradigma
Tendo em conta o papel vital da informação no sentido de dar forma, estrutura, como explicou Lucienne Cornu, e a existência de novos dados processados e acessíveis através da internet é, hoje, mais facilmente possível e provável, como defende Dieter Duhm, a alteração da organização nos organismos individuais e colectivos. Uma transformação global, impulsionada também ao nível cósmico, com a entrada na Nova Era de Aquário, com o trânsito de Plutão até 2023 e a própria alteração do campo magnético da Terra e da actividade solar com consequências ao nível do campo cerebral, genético e de frequência humano.
Esta elevação de consciência, do ponto de vista mitológico traduz-se na passagem dos deuses-céu para os deuses-terra, como explicou Jean Shinoda Bolen: de um contexto sócio-cultural patriarcal padronizado pelo medo, poder, opressão, domínio, objectividade e competitividade, modelo representado no Velho Testamento pelo Deus ciumento e vingativo, para outro matriarcal, baseado no amor, liberdade, subjectividade e solidariedade, representado no Novo Testamento pelo Deus afectuoso e clemente.
Para a autora americana, é o ressurgimento de Métis - a deusa da sabedoria, Sofia, a Mãe Natureza, que havia sido engolida por Zeus e esquecida - e com ela a emergência da ecologia, a vinculação entre e a todos os seres, desde o próprio à Terra. Sabina Lichtenfelds chama, e põe em prática em Portugal, esta Era da Deusa, da Graça, onde o poder-saber feminino é expresso, fortalecido e correspondido. Um retorno que Maria Flávia já o havia antecipado também.
Entretanto, pelo mundo prepara-se, cada vez mais ampla e intensamente, a transição para o novo modelo de tendência mais local, descentralizada, comunitária, simples e humana. Carlos Cardoso Avelino já o escreveu há mais de um quarto de século, mas, desde os últimos anos, com o problema do petróleo, as iniciativas, a nível internacional e mesmo nacional, têm sido mais determinadas, como as experiências de formação de comunidades, ou até hortas comunitárias.
O novo modelo dirige-se, entre outros, para a alegria, o amor, a coragem, a confiança, a comunhão, a compaixão, a cooperação, a cura, e também a ética, a lentidão, a memória, a paz, a protecção, a sensibilidade, a união. Tudo parte de um novo pensamento criativo de abundância, com repercussões nas mais diversas áreas, desde as ciências socias à economia. Neste campo desenvolvem-se conceitos como a Economia baseada em Recursos, Economia da Dádiva, Economia Sagrada ou Economia Social e Solidária.
Qualquer crise é uma oportunidade de mudança, de limpeza, de arrumação, de actualização, processando, compreendendo e perdoando o passado – um momento para expressar e ultrapassar tensões, libertando espaço e tempo disponível para viver o presente, aceitando os factos e reconhecendo a realidade do aqui e agora. A actual crise, potenciada pelas condições comunicacionais e sociais presentes, a nível mundial, é uma ocasião favorável a descartar de velhos pensamentos e hábitos, repetitivos e reproduzidos, como o pressuposto da escassez de recursos, em função de uma nova criatividade digna da Humanidade.
Novos começos são propícios em ciclos “um” (e nós estamos precisamente na primeira década do século XXI) mas para tal é preciso, antes, que exista um ciclo destruidor, renovador, alimentado, segundo a tradição religiosa, pelo Espírito Santo, o transformador, capaz de dinamizar mesmo o ponto máximo de estabilidade, a Terra e o corpo físico, correspondente, do ponto de vista cabalístico, à sephiroth Malkuth.
Segundo Stuart Hall, as séries da indústria cultural veiculam a ideia de que a mudança é impossível, de que é inútil desafiar o sistema e o melhor é rir. Mas, hoje, um pouco por todos os cantos do mundo há apelos à mudança. Dentro e fora do sistema, que se distanciou cada vez mais da vida (social), há pessoas e grupos envolvidos na mudança, para além dos que têm estado nas ruas, em diversos movimentos pacíficos. Como referiu Spencer Johnson “(…) quando se muda aquilo em que se acredita, muda-se igualmente a forma de actuar”.
Já a Teoria Social clássica havia notado que se o sistema é a estrutura condicionante, restritiva, ao nível individual, a agency, constitui um espaço de acção de maior liberdade. No caso do autor jamaicano este atenta que as práticas sociais são hoje constantemente reflectidas, examinadas e reformuladas à luz das informações recebidas, com inúmeras possibilidades de mudança de identidades, reforçadas pelo aumento das migrações, da globalização e das indústrias culturais.
Mudar é não só dar, “dançar”, balancear, variar, mas também alquimizar, transmutar – fazer, como diz a sabedoria popular, das tripas coração. É um processo de alternar que inclui a alteração, a transformação, mas compreende, além dela, a renovação, a recriação – uma espécie de reciclagem, numa oitava acima. Mudar implica, pois, não só ser capaz de se adaptar e flexibilizar mas igualmente de evoluir, melhorar, avançar e elevar. Envolve movimento capaz de reequilibrar, reorganizar e reformar qualquer sistema, organismo ou estrutura.
(1) RESINA, Luís – Tarot e numerologia. Pergaminho, 1998, pág.136. (2) AIVANHOV, Omraam – Pensamentos quotidianos, Publicações Maitreya, 2010 (14/2/2010).
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