quarta-feira, 30 de julho de 2008

Presente Real

Doze meses após o lançamento do "Aqui & Agora", uma prenda. Lembramos, com Eckhart Tolle, a eficácia da actualidade.

Texto Dina Cristo


Quanto mais fugimos à dor mais ela, acumulada, se expressa. Só a aceitando, reconhecendo e dando-lhe atenção, estando presentes no aqui e agora a dissipamos. No livro “A prática do poder de agora”[1], Eckhart Tolle conta como aceitar é observar (sem julgar), é dignificar e reconhecer cada instante como o melhor, é estar (no) presente, rendermo-nos[2] e dizer “sim” ao que somos, onde estamos e ao que fazemos.


Tal leva à mudança da situação, leveza e paz, possibilita maior simplicidade e, curiosamente, menos sofrimento. Depois, implica fazer o que a circunstância exige, por isso trata-se de uma acção positiva, com qualidade e prosperidade - uma via de realização que religa ao ser e não impõe condições.
O agora é o portal[3] para o Ser, a plenitude, integridade, consciência, liberdade (de escolha), mudança, é o verdadeiro poder, que proporciona calma, redime, salva e onde cada actividade é um fim em si mesma. Corresponde à intuição, o consciente que age, o Ser e o Saber para além da forma, a compaixão, sanidade, presença, despertar, aceitação e perdão que dá vera confiança; é Poder, Luz, Paz, Realidade, Aqui e Agora.
Pelo contrário, resistência é julgar, viver cada momento como um meio, insatisfação mental, negativismo emocional, é evitar e negar. Mantém a condição problemática e apenas encaminha para a preocupação, conflito e dramatismo. Precisa de máscaras e de defesas, é exigente e tem expectativas rígidas, que originam tensão e contracção corporal. Ao dizer "não" o indivíduo interpreta com base no medo, analisa, critica, rotula e, consequência de um apego mental, gera complexidade e frustração.
(Se)mente
A mente é o inconsciente que reage, o pensador e o juiz, a forma, paixão, condicionamento, que gera violência, vulnerabilidade, vitimação. É apego e separatividade, fraqueza, escuridão, ilusão, adormecimento, indecisão disfuncional, ruído e projecção mental, que provoca culpa, medo, problemas, dores e doença.
Em “O poder do agora”[4], Eckhart Tolle explica como a mente é tagarela, produz poluição sonora, resiste, categoriza, compara, julga, condena, especula, lamenta-se e preocupa-se, cria filmes mentais e se torna num vício, pensamento compulsivo que ataca, castiga, desvitaliza, angustia e é muitas vezes repetitiva, inútil e até prejudicial. Condicionada e dualista, ela provoca ansiedade, necessidade, apego, suscita discussões e torna-se estéril e insensata, sempre que usada de forma incorrecta. O positivo é que nós não somos esta mente pensadora: estamos para além dela.
Segundo o autor, existe um tempo psicológico, a identificação com o passado e a projecção compulsiva no futuro, e um tempo cronológico, o presente, que também deve servir para aprender com os dias idos e estabelecer objectivos para o que há-de vir, mas sem prisão. O excesso de passado leva ao sentimento de culpa enquanto demasiado futuro acarreta medo. O agora é tudo o que existe, só o presente é real e pode ser enfrentado.
A mente usa estratégias para evitar o agora, pois a personalidade adora sentir-se infeliz, ressentida ou com pena de si própria. Há, então, propõe o autor, que honrar e reconhecer o passo actual, aceitar o momento incondicionalmente, concentrar toda a atenção no presente e entrar profundamente no agora; parar a mente, retirar-lhe tempo e restringir ao presente, dando-lhe espaço; aproveitar para observar os pensamentos-sentimentos e sensações corporais, concentrar na própria respiração, meditar e permanecer [5]consciente. Quanto mais atenção e qualidade de consciência, mais presença haverá.
Há, assim, dois caminhos: o tempo psicológico, da resistência, do passado/futuro, da mente, que mantém a situação e produz dor, medo, insegurança, infelicidade e o tempo do relógio, da aceitação, do aqui e agora da intuição, que muda a ocasião e leva à paz, confiança e alegria. O poder da escolha é nosso.

[1] Ed. Pergaminho, 2004. [2] Para além da felicidade ou infelicidade há a paz, que vem da rendição e nos conduz à leveza e à liberdade; pelo contrário, a resistência leva à dor, à rigidez, à separação, ao sofrimento. Só este último, a nossa cruz, nos força a render, altura em que dispensamos o passado. Mas a aceitação não significa indiferença nem inactividade. [3] Há vários portais que dão acesso ao não manifestado: o agora, o parar de pensar, a rendição, o silêncio, o espaço (quase cem por cento das matérias aparentemente sólidas é espaço). [4] Pergaminho. 2ª ed. 2003. [5] O estado de presença tem uma energia de alta frequência.

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quarta-feira, 23 de julho de 2008

Informação para o milénio


Sexta-Feira, dia 25, comemoramos o nosso primeiro aniversário. Agradecemos a todos quantos nos leram, colaboraram e se entusiasmaram com este projecto. É a eles que dedicamos este artigo sobre informação solidária, cuja última parte publicamos aqui e agora.

Texto e fotografia Dina Cristo

Esta corrente, que considera que a actual agenda mediática não serve os interesses dos cidadãos, pretende-se diferenciar da comunicação social “major”, inovando processos, técnicas, normas e finalidades. Está normalmente pouco estruturada e tem duração breve ao nível temporal embora possua, em regra, significativas potencialidades de desenvolvimento, devido à força nascente de um movimento social, como lhe designou Francesco Alberoni. Umas vezes sub-corrente outras mesmo contra a corrente predominante, apresenta propostas alternativas e/ou complementares ao sistema habitual de rotina produtiva e consumo mediático.
A informação solidária tem-se manifestado num sentido mais autêntico da liberdade e da legalidade (ética), numa humildade jornalística que admite ter errado, que dá espaço, tempo e “voz” aos múltiplos receptores, através dos provedores, que tem a coragem de se auto-regular - marcos, ao nível da ética e deontologia, orientados para conteúdos abrangentes, profundos e úteis.
A informação solidária propõe-se trazer a vida para a informação, em vez da artificialidade das salas onde se proferem declarações, e continuar também a descrever o desvio, mas pela positiva. Exercida por um profissional ou voluntário que co-labora, no capital e no trabalho, nas crises e nas vitórias, em vez do jornalista, isolado ou trabalhador mal remunerado. A IS é uma comunicação social que estimula o desenvolvimento do potencial humano e se recusa a explorar os seus instintos.
O desafio agora é transformar as fragilidades, erros e insuficiências do jornalismo actual em oportunidades para se expandir um novo, mais agradável para quem o faz, mais útil para quem o consome, mais próximo da arte do que da técnica. A informação solidária, co-operativa, aproxima mais Emerec afastando-se mais das tácticas e estratégias de luta de audiências, de conquista de mercado, de derrota do concorrente inimigo. No modelo solidário de informação esta não é mera plataforma para a publicidade e a indústria comercial; pelo contrário, ela é não apenas vista mas exercida como pérola nobre da vida colectiva, que promove os valores humanos e não a crueldade, a vida e não a morte, o altruísmo e não o crime, a paz e não a guerra.
A informação solidária estimula a natureza eminentemente humana, no que tem de melhor, incentiva o potencial evolutivo do Ser Humano, acredita num aperfeiçoamento contínuo, numa reciclagem permanente, em que se retira o excesso de lixo (mental e informativo) e se deixa espaço, renovando, para a entrada de novos estímulos mais conformes à sua natureza e sensibilidade.
A profundidade, a qualidade e a diversidade são as principais marcas da informação solidária, que não se limita ao aqui e agora, fragmentado, mas integra-o num pretérito e num futuro e responde pelos seus actos e consequências. A IS prima pela variedade de temas, autores, fontes, perspectivas, ângulos e enquadramentos mas, acima de tudo, pela recuperação da procura da verdade.
Voluntária, esta informação ultrapassa mesmo a mera dimensão humana, colocando em movimento a dimensão ecológica, do respeito pela vida de todos os seres, incluindo animais e plantas, em que à semelhança da ecologia profunda se coloca ao serviço da vida.
Na prática, a nível internacional, o “Le Monde Diplomatique” ocupa um espaço importante de discussão pública dos grandes temas de política mundial raramente debatidos e com semelhante profundidade de análise. Mas a informação solidária não é um condómino fechado nas mãos de nichos de mercado; também ao nível individual e colectivo está presente nos grandes grupos de empresas de comunicação social. No caso do Brasil, a editora Abril tem realizado um investimento na informação alternativa, mesmo integrando nas suas edições temas e líderes de opinião nas franjas do sistema.
Durante os últimos Fóruns Mundiais, a comunicação alternativa tem reunido esforços e cooperado no sentido de recolher, produzir e distribuir informação sobre o evento. Nascem mais “cores” em que é relatada a realidade mundial. O IPS, a agência de notícias de solidariedade, faz algo idêntico e de forma contínua. Experiências de agências de carácter voluntário irromperam, como o caso da Agência de Informação Solidária, em Espanha. Surgem publicações como “A informação solidária – a comunicação social como prática de uma nova ética”, de Carlos Cardoso Aveline, jornalista brasileiro, no qual este faz o retrato da origem e evolução desta informação no Brasil, aponta casos práticos e perspectivas de desenvolvimento futuro. O livro teve uma actualização no final de 2007, altura em que se experimentou uma acção junto do “Correio Braziliense”, apelando a uma maior qualidade jornalística e padrões de ética mais elevados.
Em Portugal, começam a aparecer alguns projectos, como o Mudar de vida, a IM - apenas presente na web, a orientar-se para o que há de melhor na humanidade e para a solução dos problemas. Ao nível da rádio, programas como “Mais cedo ou mais tarde”, na TSF, marca(ra)m a diferença: tratamento de temas pouco usuais, de forma invulgar e com tempo para a explicação e compreensão, “num espaço de informação claramente alternativo à actualidade noticiosa”, como refere o blogue do programa. Nas revistas, a “Biosofia”, com sete anos no mercado nacional e praticamente sem publicidade, persiste em informar o público acerca da natureza mais profunda da vida, dos seus mistérios, das grandes interrogações humanas, da filosofia e da sua prática quotidiana.
Síntese informativo-comunicativa
Estamos na primeira década do século XXI, a encetar o terceiro milénio. Depois da tese e da antítese, após a oposição entre subjectividade e objectividade, estes mil anos que agora parecem dar lugar à síntese, à sua superação numa união para uma informação mais completa e válida. Após a subjectividade do século XIX e da objectividade do século XX, este século que agora se inicia pode ultrapassar, conjugar e convergir numa rotina de produção de informação com todo o respeito pelo carácter do sujeito que informa tal como pela natureza do facto que é conhecido, em que a honestidade e equilíbrio possam estar ambos presentes para assim formarem um conhecimento mais integral e verdadeiro. Ultrapassando a cisão que separa a rigidez objectiva e subjectiva, a informação poderá integrar ambas as vertentes, emotiva e racional, numa inteligência intuitiva: emotiva, sem ser sensacionalista, e racional, sem ser estratégica, num equilíbrio de recursos humanos.
Como síntese entre os opostos, entre a exploração do mercado (a via mercantil), com objectivos puramente lucrativos, como o faz a informação industrializada dos conteúdos neutralizados, e a pureza de intenções (a deontologia) ao nível da moral humana, sem sustentabilidade, eis um modelo de uma prática que reúne o que ambos têm de melhor, integrando-os em vez de anular um deles, sejam os valores éticos ou a sustentabilidade económica.
A proposta de informação solidária é conciliar a liberdade e a ordem, através do respeito pelas regras, as leis. É o racional (a ética humana) a ordenar a liberdade das emoções, sensações e desejos, quer ao nível de quem emite quer ao nível de quem os recebe, a regrar os impulsos emocionais mais confusos, desorganizados e sem ponderação ou fundamento. Trata-se de um projecto que indo ao encontro dos interesses do receptor, não se submete aos seus gostos mais cruéis. Moderada, não se limita apenas à ordem rígida do que se pode ou não informar, e como, nem somente à liberdade de contar tudo de qualquer forma, optando antes pela sua conciliação entre o livre arbítrio para escolher, e responder pela opção efectuada, e a necessidade de o fazer com base em critérios deontológicos, em procedimentos correctos que obedecem ao que deve ser e não ao que é e muito menos ainda ao que o mercado exige.
Conclusão Informação é aquilo que forma, dá forma, organiza e estrutura uma organização, um sistema e lhe dá coesão. É a informação que nutre ou intoxica a sociedade, conforme o ciclo virtuoso ou vicioso, assim flua livremente ou fique retida em obstáculos, ruídos planeados. Sendo estruturante de uma sociedade, a informação é a base da constituição e natureza social; conforme a sua quantidade, qualidade e diversidade assim a comunidade (unidade comum de objectivos) será mais ou menos equilibrada, harmoniosa e eficaz.
Numa concepção multi-cultural, em que cada um é, à sua escala, imprescindível para a economia do todo, de modo que a sua participação e integração é fundamental para que, através de uma informação realmente clara e relevante, se possa construir as bases de uma sociedade de comunicação, em que todos sejam respeitados naquilo que têm de diferente para oferecer ao enriquecimento do todo colectivo num processo crescente de unificação cultural.
A sociedade de comunicação, que assente os seus pilares na sociedade de informação, representa um processo construtivo e colectivo de harmonia social, que passa pela integração de todos os seres, humanos e não humanos, o respeito por e entre todos e sem a exclusão de nenhum deles, o que seria um revés para a riqueza do conjunto. Numa sociedade assim não há lugar para a ignorância, o medo e o preconceito; pelo contrário, nela progride o conhecimento, baseado numa informação livre e liberta, pela coragem de querer conhecer o desconhecido até o reconhecer e entender que, no caso humano, é mais aquilo que nos une do que aquilo que nos separa.

Livros: AAVV – Por uma ética da comunicação – jornalismo social, Lisboa, Padrões Culturais Editora, 2007. AAVV - Comunicação, ética e mercado, Lisboa, Universidade Católica Editora, 1999. AVELINE, Carlos Cardoso – Informação solidária – a comunicação social como prática de uma nova ética, Blumenau, Edifurb, 2001. CHOMSKY, Noam – A manipulação dos media – os efeitos extraordinários da propaganda, Editorial Inquérito, 2003 CORNU, Lucienne – Neurocomunicação – para compreender os mecanismos da comunicação e aumentar as competências, Editora da Universidade de Caxias do Sul, s/d. FAUSTINO, Paulo – Ética e responsabilidade social dos media, Formal Press, 2007. McQUAIL, Denis – Teoria da Comunicação de massas, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2003. PUREZA, José Manuel (Org.) – Para uma cultura da paz, Coimbra, Quarteto Editora, 2001. RAMONET, Ignacio – Propagandas silenciosas – massas, televisão, cinema, 2º ed., Campo das Letras, 2002. TIAVEA, Tuiavii – Palalagui, Edições Antígona, 1999. Revistas BAPTISTA, Carla – A investigação em ciências da comunicação já tem uma história para contar. Jornalismo & Jornalistas, nº32 (2007), p. 36-38. BARBOSA, Paulo – Aspectos quânticos do cibertexto. Cibertextualidades. Edições Universidade Fernando Pessoa, nº1 (2006), p. 11-42. FREITAS, Helena de Sousa – Cooperar pelo futuro do jornalismo. Jornalismo & Jornalistas, nº30 (2007), p.6-15. SANTOS, Paula Matos – Toda a economia deveria ser solidária. Pessoas e lugares. Lisboa, Julho/Agosto 2005, p. 4-5.

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quarta-feira, 16 de julho de 2008

Informação sustentável

Quase a completar um ano, publicamos a primeira parte de um artigo sobre a fonte inspiradora deste projecto: a informação solidária.

Texto e fotografia Dina Cristo

Ao encetar o terceiro milénio, eis uma nova proposta de concepção e prática informativa: solidária, profunda, cooperativa, diversificada, sintética, lenta e humana. Uma alternativa à dominação das técnicas de manipulação e propaganda, que poluem a imprensa e intoxicam os cidadãos; uma resposta ao nível da comunicação social da mudança para um paradigma pacífico, ecológico e responsável.
Numa sociedade de consumo, onde quase tudo está à venda, com um preço de acordo com o nível de procura, e num sistema capitalista, que privilegia o capital económico-financeiro em detrimento de valores de honradez ou nobreza de carácter, o público está facilmente exposto aos riscos da comunicação hiper-industrializada, fértil em manipulação, em doses massivas de propaganda, de terror informativo, de incitamento ao medo, à dependência, ao isolamento e à inacção, apesar de todos os discursos em prol da cidadania activa e participativa visando o aprofundamento de uma sociedade democrática.
A informação solidária (IS) pretende dar instrumentos e condições para libertar o ser humano, seja ele produtor ou consumidor de informação, da dependência de quem o manipula, abusando da sua boa-fé, da sua confiança e ingenuidade para, através do estimulo de desejos, o conduzir a adoptar os comportamentos estrategicamente previstos.
O seu meio privilegiado é o webjornalismo, campo mais propício ao desenvolvimento deste movimento informativo, onde a par de uma nova agenda para a paz, com todas as suas repercussões, ganham importância novas áreas como a da responsabilidade social e a defesa de um quinto poder.
Quando o argumento mais comum para o terror informativo é o de que o mundo precisa de saber o que se passa, e, na sociedade da imagem, mostrar é uma forma de esconder aquilo que não se pretende que se saiba, o jornalismo tradicional está ainda na razão inversa da “informação”.
Património informativo


O século XX foi uma centúria de opressão, censura, manipulação, propaganda, distracção, entretenimento, “infotainment”, de adormecimento, alienação, dependência, inconsciência, irresponsabilidade e impotência, como mostra o documentário “Zeitgeist”. A propaganda manipula o cidadão e controla-o através do medo e das emoções, mantendo-o quieto, como se faz às crianças quando se tira da cartola o “bicho papão”.
No início do século XX um elemento de uma tribo desenhava-nos o perfil de ocidentais no que têm de pior ao nível da comunicação em sociedade: a prisão - dos apartamentos, das salas de cinema, dos próprios jornais -, a falta de contacto com a realidade. A necessidade de mediação, a leitura e interpretação da realidade em substituição da experiência directa e a homogeneidade. “Papalagui” mostra como a superioridade das culturas se reduz a uma questão de perspectiva e mais ainda de etnocentrismo, egoísmo em termos colectivos, arrogância em alguns casos e incompreensão em muitos deles. Fala-nos do excesso de informação e da “indigestão” que tal causa; o princípio de que nem tudo o que ingerimos é assimilado, neste caso pelo organismo mental.
A evolução da consciência humana quanto à manipulação (dos “media”), por um lado, e à necessidade de auto-realização, por outro, através de uma vida pacífica e harmoniosa, interna e externamente, a nível individual e colectivo, repercutiu-se num novo paradigma civilizacional e mediático, representado pela informação solidária.
Este novo modelo de comunicação social valoriza a força da união e da liberdade em detrimento da fraqueza do isolamento, permeável ao abuso e à opressão. A proposta é de uma maior consciência, autonomia e responsabilidade do Emerec, que ofereça protecção ao cárcere da segregação, competição, egotismo e isolamento, condições propícias a que a indústria cultural manipule o público, fragilizado.
O “segredo” de gerar consenso social para que as entidades empresariais possam ter o apoio dos próprios cidadãos, frágeis, isolados e crédulos, aos interesses daqueles, de colocar a maioria da população ao lado, de acordo, ou pelo menos não se mostrar contra, e silenciá-la, sem proibi-la de falar, está na indústria das relações públicas, que convence o público a acreditar nas mensagens falsas ou ideias distorcidas. A massa, como uma criança, confia e acredita em quem tem legalmente o poder de a informar.
Perante este voto de confiança, por vezes às cegas, a indústria das relações públicas persuade o público acerca de quase tudo, necessidades, veracidade das informações, e transforma as suas crenças e convicções em equívocos mal compreendidos, numa dependência, vitimação e necessidade de aprovação que só aumenta em ciclo a sua falta de confiança. Um ciclo vicioso difícil de sair – um cativeiro, local óptimo para a escravização, onde os senhores da indústria da comunicação o dom(in)am.
Novo paradigma social
Após a destruição provocada pelas guerras mundiais, emerge um novo paradigma de paz e cooperação. Surge por um lado a revolta contra o autoritarismo e por outro o desejo da devolução do poder ao povo, a democracia, o respeito pelas minorias; desponta um paradigma ecologista, uma visão de solidariedade ao nível planetário. No fundo, os ideais da Revolução Francesa começam a expressar-se de forma notória.
Há mais de duzentos anos que foi necessária uma revolução para terminar o autoritarismo e o absolutismo. Aos poucos instituem-se, primeiro nos ideais depois na prática, os valores da liberdade, da igualdade perante a lei e em dignidade humana, a fraternidade, a solidariedade, a união que reforça o poder de cidadania. Numa visão mais ampla, cada parte integra um todo, ao qual pertence, e no âmbito do qual está inevitavelmente ligada às outras: a comunidade em rede, reticular de que nós hoje experimentamos; um modelo horizontal de comunicação, descentralizado e democratizado.
Desde a sequela da I e II Guerra Mundial, quer ao nível diplomático quer ao nível do direito internacional, os valores da cooperação e da paz têm estado na agenda política. O respeito pelos direitos humanos e a importância da pacificação dos territórios, evitando as mortes, atrocidades e crueldades, têm sido uma preocupação. Desde há décadas que os homens se juntam em conversações e diálogos para tentarem pela via verbal aquilo que anteriormente era resolvido militarmente.
Ao nível nacional e internacional foram criados vários organismos e instituições com estas preocupações (como a UNESCO, a Comissão Justiça e Paz, a Universidade da Paz). Na prática, há uma parte da comunidade que se agita face aos novos valores. Exige-se uma agenda para a paz, comemora-se o Dia dos Jornalistas pela Paz, há institutos que formam os jornalistas neste sentido (caso da Agência internacional pela Paz) e novos projectos no âmbito do jornalismo alternativo vão surgindo. Entretanto, o paradigma tem tido alguma expressão ao nível social, económico e científico.
Ao nível social, a globalização, processo de conhecimento, troca, partilha, integração e fusão cultural que vem, pelo menos, da era dos Descobrimentos, em cuja promoção o comércio tem sido pioneiro, tem provocado, juntamente com a venda de bens e serviços, o contacto humano e a troca de ideias, crenças, valores, formas de estar e conceber o universo. O processo de construção de um planeta numa aldeia global, antecipado por vários homens da ciência, é visivelmente sentido nos dias actuais. Ele visa, em última instância, a promoção da partilha humana, ao nível cultura e tem derrubado, por isso, várias fronteiras mentais, psicológicas e físicas, como foi o caso do muro de Berlim ou o fim do “apartheid”.
Ao nível económico, a economia e comércio solidários são hoje, perante a globalização económica internacional, uma alternativa humana, que tem em consideração a vida das pessoas, de quem trabalha, de quem consome, de quem vende e respeito por um padrão ético.
Ao nível científico, surge a teoria de Gaia, de James E. Lovelock, os campos mórficos de Rupert Sheldrake, a física quântica e a teoria das cordas, o paradigma holístico.
É, assim, na transição do século XX para o século XXI que mais se fazem sentir os efeitos da mudança de paradigma: ecológico, solidário, democrático que, ao influenciar vários sectores, não pôde deixar de ter efeito sobre os “media” e o jornalismo.
Nova concepção informativa
Os Estudos Culturais vêem os “media” como opressores mas também com a potencialidade de se transformarem em instituições de libertação. Se derem voz às minorias (étnicas, culturais, religiosas, políticas, sociais, económicas, sexuais entre outras) estarão a equilibrar a sua representação mediática com a sua existência efectiva. Ao variar as fontes a que recorrem, os “media” estarão a relatar a realidade sob diferentes ângulos contribuindo assim para o enriquecimento de olhares e um conhecimento mais completo. É a valorização das várias culturas, modos de fazer dissemelhantes, que podem ser úteis ao desenvolvimento humano em detrimento de predomínio de um só ponto, uniforme, politicamente correcto, convencional, de uma legitimidade construída.
O relatório McBride, escrito há cinco décadas, está ainda por cumprir, mas foi um marco desta nova etapa. O documento apontou as fragilidades de uma informação internacional desequilibrante, com o predomínio das fontes e relatos dos países do norte em relação aos do sul, e salientou a importância de reequilibrar o fluxo informativo para o progresso e desenvolvimento político e social dos países e continentes. Para que o retrocesso não suceda e o sistema social não bloqueie era - e é - urgente o livre fluxo de informação, o seu livre curso.
Estamos, pois, a usufruir dos primeiros resultados das alterações havidas no último quartel do século XX. Após a “era” do jornalismo de opinião, no séc. XIX, e do jornalismo industrial, no séc. XX, eis que emergiram no seu final novos meios, técnicas, ideias e condições de produção informativa. Depois dos “media” tradicionais, surge um novo, multimédia, que os converge.
A web permitiu nos últimos anos do século XX conjugar e conciliar a forma e a técnica. Além da passagem a um nível de informação virtual, numa dimensão desmaterializada, permitiu a integração dos meios de comunicação até então separados em imprensa, rádio e televisão, na sua dimensão escrita, oral e (audi)visual. A Internet possibilitou o multimédia, a síntese mediática, que no caso do webjornalismo conjuga todas as linguagens anteriores, promovendo a evolução da linguagem jornalística a um nível de hipertextualidade, "multimedialidade" e interactividade inovadoras.
A história da comunicação e do jornalismo tem sido um acumular de técnicas que têm permitido ultrapassar ou eliminar barreiras de tempo e de espaço. Por outro lado, a informação tem-se orientado, com alguns momentos históricos de censura e inquisição, para a descentralização, com tendência a ser democrática, de acesso cada menos restrito ao poder de saber. A web, flexível, ubíqua, é um instrumento técnico que tem permitido, desde a viragem do século, um impulso a esse desafio que é formar uma comunidade cada vez mais internacional, com uma opinião pública, e concretizar a utopia da comunicação, tornar como um, numa unidade o globo terrestre.

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quarta-feira, 9 de julho de 2008

Leve-leve

S. Tomé e Príncipe comemora este fim-de-semana 33 anos de independência. Altura para passarmos em revista a situação política, social e económica do país.

Texto e fotografia Pascoal Carvalho

De um encanto, que se esperava sustentável e duradouro, a uma progressiva destruição, oportunismo, crucial e inevitável, dos mais dotados e bem situados.
Bem conhecido por um ditado popular, “leve-leve”, como que se dissesse (sem pressa, stress, grandes correrias), São Tomé e Príncipe (STP) tem vindo a deixar-se ir abaixo por um mundo ilusório, descansado, despreocupado, mas também muito burlão, porque assim nada vai adiante e, sem exigências de parte a parte, o país fica sem produção nem produtividade.
De Caué a Paquê
[1], do interior ao litoral, abandonando as águas tépidas do mar que banha toda a costa destas lindas ilhas de nomes santos, até ao interior das agradáveis, desfrutáveis e relaxantes cataratas que jorram das infindáveis capas verdes e naturais dividindo zonas e caracterizando-as até às cerradas matas muitas vezes montanhosas do ôbô[2].
Bem conhecida pelas maravilhosas praias requintadas com sombras que a natureza não se minora em presentear com os mais variados aforros, desde a terra fértil até à passividade populacional, São Tomé e Príncipe é um oásis situado no golfo da Guiné, que já teve em outros tempos bons momentos para satisfações saudáveis. Após a independência, em 12 de Julho de 1975, a qual muitos defendiam que não fosse total, como acabou por se concretizar, que até hoje este pequeno Estado nunca encontrou um válido. oriundo e genuíno filho seu que fosse capaz de levar este aconchegante canto do mundo para um desenvolvimento sustentável, estável e sólido que desse realmente gosto e gozo de (e para) viver.
Há quem diga que STP não encontrou a plataforma necessária que impulsionasse para uma futuro risonho pelo facto de se ter tornado independente num dia aziago. Por coincidência ou não, a verdade é que nesta data regista-se sempre inúmeros acidentes de viação, e não só, o que faz acentuar ainda mais este facto de grande valor para o senso comum.
Contradições sociais

Depois de ter grandes esperanças na classe empresarial, o chefe de Estado, pensando que muito facilmente STP e os são-tomenses teriam e estariam em condições de saírem desta crise, os mesmos vivem agora uma fugaz dinamização jovem que o chefe do Governo quer implementar para já com certas agilidades, que focam bem estas intenções.
Vive-se em STP uma coligação quase impensável há pouco tempo atrás. Julga-se que a vontade de fazer crescer um país mais forte e desenvolvido, capaz de proporcionar aos seus filhos uma regular e saudável distribuição de riquezas e oportunidades, foi mais intensa e ultrapassou as barreiras e divergências político-partidárias trazendo ao de cima a vontade e consciência humana.
Inicialmente reconhecido por uma existência acentuada de indivíduos formados ainda na época do colonialismo, em que muito se falava da independência, a união São Tomé e Príncipe nunca esteve em causa, mas dado o progressivo e acelerado ritmo a que particularmente o Príncipe se encontra mergulhado eis que as contradições entre os oriundos tanto de uma ilha como da outra têm vindo a fazer-se sentir em diferentes frentes e grupos sociais, fruto das excessivas centralizações dos serviços e bens. Muitos são os quadros genuínos da ilha do Príncipe que se encontram em São Tomé por aqui encontrarem o que tarda a chegar à irmã, o que a tem deixado cada vez mais para trás no que toca ao desenvolvimento local.
Sociedade
Constituída por várias raças que estão distribuídas por diferentes regiões do país, de norte a sul, São Tomé e Príncipe ainda tem alimentado os seus filhos com a fertilidade do solo, ignorando o seu pouco empenho e dedicação. Desde os tempos mais remotos que se sabe que os foros nunca tiveram o gosto pelo trabalho das roças onde estão e das quais necessitam para a sua própria sobrevivência. Com isso, os colonizadores tiveram que importar gente de outras paragens luso colonizadas (Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné Bissau), para dar corpo ao cultivo das férteis terras. Entretanto, não obstante, este arquipélago foi em tempos dos maiores produtores de cacau e café.
Depois de tanto tempo de certas dependências desses produtos (que saibamos dizer nunca deixou ficar mal os seus filhos), eis que surge o petróleo que para muitos é, ou veio, amaldiçoado pelo facto de trazer consigo inúmeros problemas sociais, acordos e suas anulações, equipas e comissões, empresas e leis que fazem de STP hoje em dia um país que vive com imensos sobressaltos e inquietações do que por aí há-de vir com o refugiar esperançado na solução petrolífera milagrosa.
Actualmente, a sociedade são-tomense vive desfasada pelas irregulares faixas sociais. Para já ressaltemos os candongueiros que outrora algo afastados ou encostados pela sociedade mais intelectual ou académica, vieram a provar o seu valor pela inteligência e queda para o comércio, inicialmente informal e ambulante mas agora mais estável e concentrado; eles hoje tornaram-se numa classe económica que tem muito a dizer sobre o país e em prol do mesmo. Não obstante a este inclinar para os negócios, também têm vindo a conseguir concluir com êxito os seus estudos secundários, 11º ano, que é actualmente o máximo para quem não quer levar adiante o seu conhecimento académico, seguindo depois para o ensino superior ou curso médio.
É de salientar, ainda no campo da educação, que as gerações de 80 e mais acentuadamente de 90, actualmente detêm um certo comportamento de descrença total no país e seus governantes, em particular transportando consigo um pensar sólido de não ter esperanças nenhumas de ver melhorar o país, nem mesmo daqui a algum tempo. Tal contradiz com a maneira de ver e pensar dos que já têm mais tempo de vida: a de que ainda é possível mas que para isso os são-Tomenses teriam que tomar consciência e dar ao país aquilo que ele realmente quer e precisa (boa gente, com garra, vontade, fé e inovação); contudo, individualmente preferem estar no exterior, ignorando desta forma a realidade central da pátria.
Culturalmente, STP é um país rico e diversificado, muito por responsabilidade das influências coloniais. Cada cidade e região tem as suas manifestações culturais identificando-se assim por essas tradições e crenças o que vem encontrar depois no exterior uma espécie de fusão inovadora e algo defeituosa pelo querer representativo contrastando com o saber originário, o qual a mesma invoca.
Economia

Apesar de bom produtor agrícola, S. Tomé e Príncipe nunca foi capaz de se manter na vanguarda da produção ou conquistar um mercado sustentável para o escoamento. O comércio até hoje é baseado em vendas de artigos hortícolas, ainda frescos do dia, peixe pescado a poucas horas no mar, pão do dia e também guardado de dias anteriores (o pão comercializado pode ser acompanhado de outros condimentos como manteiga, marmelada, açucarinha, aranha, etc.), podendo ser encontrado no mercado formal, nas padarias, ou informal, no comércio ambulante, porta a porta, ou nos mercados.
Outros artigos, do tipo de géneros de primeira necessidade, são igualmente comercializados pelos bem conhecidos candongueiros, que por sua vez fazem sociedades com imigrantes, pequenos e grandes comerciantes que escolheram este pequeno país para viverem. As vendas a retalho se por um lado ajudam, e de que maneira, os que menos têm, prejudica e condiciona muito esta mesma gente quando casados.
Educação e saúde

A educação parece ficar para trás no que toca à prioridade dos sucessivos elencos governamentais que têm passado por estas terras. Outrora a educação, a par da saúde, estava no topo das atenções dos programas do Governo que hoje em dia parecem perder lugar para o tão anunciado petróleo que todos sonham poder ser a fórmula milagrosa para tirar este arquipélago da precária situação em que mergulhou.
Com uma população bastante jovem, os são-tomenses têm por hábito sempre se preocupar com a educação dos seus filhos. Mesmo aqueles que não têm uma condição financeira desejável nunca aceitam que os seus descendentes venham a ter uma vida sequer parecida com a deles, descarregando sobre os mesmos algum desabafo do querer e não poder proporcionar algo melhor que lhes pudesse garantir um futuro mais risonho e arrojado.
Para os que vivem mais distantes da capital é sempre um sofrimento poder dar continuidade aos seus estudos por causa das despesas relacionadas com as deslocações, primeiro, e depois com outros encargos.
A saúde é dos sectores mais afectados e preenchido de infelicidades pelo facto do mesmo não encontrar formas nem plataformas de sustentabilidade capaz de dar algum salto, nem ao menos passos. Bastaria olhar para o quadro numérico dos hospitais que havia aquando da colonização e actualizá-lo e veríamos a progressiva deterioração acentuada a que os mesmos foram sujeitos até ao seu desaparecimento, o que contrasta com o continuado crescimento da população. O Centro Hospitalar de S. Tomé é hoje o único hospital que ainda presta serviços gerais de saúde, ainda assim com enormes dificuldades multi-sectoriais e funcionais. Apesar de apoios e acordos constantes, apenas este centro tem conseguido à distância minimizar as necessidades da população que dia-a-dia vai sofrendo com este défice.

[1] De ponta a ponta Caué, distrito de S. Tomé, e Pague, Distrito do Príncipe. [2] Mata serrada, revestida de forte densidade de arbusto e insectos, muitas vezes montanhosas e com chuvas abundantes.

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quarta-feira, 2 de julho de 2008

Vida chinesa

No Ano Europeu do Diálogo Intercultural (AEDI) e próximo das férias, apresentamos um olhar sobre um património milenar: algumas das centenas de fotografias tiradas por uma pintora timorense de origem chinesa, durante a sua última viagem pelo Oriente.

Fotografias Nhu Lien
Telhados ... com vista para o lago Lua e Sol, em Tai-Wan
Ric -xo, transporte através da força humana
Entrada para um restaurante (perto do túmulo de um dos imperadores) Tecto de uma das mais antigas ervanárias milenares Templo dos estudantes em Pequim, Beijing A Grande Muralha Jardim imperial, em Pequim

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