quarta-feira, 8 de abril de 2009

Anti-depressivos?


Após o Dia Mundial da Saúde, natural, sem medicamentos, tratamos a depressão. Vista como um inimigo a debelar, o quanto antes, ela é uma animadora em potência. Desde que vivida de forma autêntica, pode transmutar a tristeza em alegria e a angústia numa profunda paz de espírito. Basta deixá-la manifestar que depressa se dissipa.

Texto Dina Cristo

Além dos medicamentos, os pensamentos e sentimentos negativos são uma das causas mais comuns da depressão. Um deles é a culpa. Sentir-se culpado, sem capacidade de controlar uma situação (exterior) adversa leva, algumas vezes, à “queda” interior.
Estar depressivo é não ter energia, vontade ou motivação, por vezes, para as necessidades mais básicas, como a alimentação, a higiene, ou mesmo o vestir-se. Enfrentar-se a apatia, indolência e mal-estar é muitas vezes o princípio do fim da própria situação. A mudança para um estado melhor e mais saudável acontece, de forma espontânea.
Mas como se passa da passividade à actividade, da descrença ao desejo de agir, da fraqueza à força para empreender de modo autêntico? Não lhe virar a cara, aceitar o estado depressivo é o primeiro passo para o transcender. Resistir-lhe, através de comprimidos ou falsas reacções, é o caminho mais longo para a cura.

O que é?

A depressão representa um desequilíbrio entre o estado interior e as exigências exteriores, entre o querer e o ter de fazer, entre o que se sente e o que a sociedade “obriga” a expressar. Deprimir é muitas vezes o sinal de desarmonia entre o que se é e a imagem que se ostenta, daquilo que se gostava de ser ou que os outros exigem que se pareça.
Nesse sentido estar deprimido é um sintoma de um mal-estar, um desalinhamento entre o ser mais íntimo e a actuação social. Pode ser igualmente um sinal de desajustamento entre os desejos da personalidade e a vontade da alma, de cujo fado (tão) português é uma expressão sublime.
Numa sociedade desassossegada, permanentemente agitada em correria contra o tempo, o estado passivo a que a depressão induz é mal aceite. Como afirma Ana Paula Rocha, psicóloga e psicanalista: «O par complementar – inflação narcísica e sadismo – muitas vezes mais não é do que a reacção e defesa contra a condição depressiva”. Prefere-se, (ainda) assim, a hiperactividade - o outro lado da depressão.
Contudo, ela não é mais do que o resultado de nódulos psicológicos que anteriormente não foram desatados e se acumularam. Revelam-se mais tarde em bloqueios que obrigam a parar, seja através de uma doença, um acidente ou incidente que despoleta a letargia, a incapacidade de reagir. “De repente” os nós esticam e apertam-se de tal forma que a dor, não (devidamente) processada, se evidencia. A pessoa, diz-se, encontra-se esgotada, de tanto nervoso acumulado.

(In)aceitável

Material e imediatamente improdutivo, este estado de paralização é considerado um autêntico atraso de vida que, numa sociedade orientada para o lucro e a produção, é considerado algo a eliminar, o mais urgentemente possível. E assim, aos primeiros indícios de “fraqueza” o médico receita um anti-depressivo. Medicina preventiva, argumenta, que visa evitar o agravamento da situação e, para precaver um eventual suicídio, o melhor é receitar naquele instante o fármaco não vá o sintoma de efeitos secundários dos outros químicos se manifestar novamente.
Medicamentos, stress, pensamentos negativos, falta de auto-confiança são, pois, algumas das suas várias causas. A primeira reacção pode ser, portanto, afastá-la. Mas e se a atitude for enfrentá-la, que acontecerá? Em casos comuns se o indivíduo aceitar o seu estado de espírito, ele conduzi-lo-á mais longe, ou seja, a estados de pensamento e sentimento mais profundos do que os habituais.
Na verdade, a pessoa que deprime pode atingir o mundo de Hades, o subterrâneo de onde se poderá elevar até às alturas até então impensáveis. Quanto mais auscultar a terra mais facilmente poderá perscrutar o céu. O estado bipolar é um exemplo do qual nascem criações artísticas de extraordinário valor. Se tivéssemos medicamentado os nossos escritores e artistas não teríamos hoje belas obras das artes e das letras, incluindo em Portugal, onde Fernando Pessoa é um dos exemplos.

Faz bem?

Deprimir traz inúmeras vantagens pouco conhecidas e discutidas. Sendo resultado, quantas vezes, de uma desilusão, ela permite logo à partida ajustar a percepção individual à realidade do mundo. Traz consigo um aprimorar de conhecimento e consciência ao qual é necessário algum tempo para reajustamento da personalidade que, até ali, acreditava ser outra a verdade. É o “preço” de conhecer mais e melhor a realidade.
Se enfrentada, aceite e vivida, a depressão gera uma limpeza psicológica e uma arrumação mental em que após tal libertação de resíduos, o indivíduo fortalece-se, amadurece, desenvolve-se e renova-se. Actualiza-se consigo próprio, com a sua renovada visão de si, do mundo, das coisas e das pessoas. De nervoso, angustiado e indiferente, a pessoa, antes doente, renasce naturalmente vitalizada, confiante e sensibilizada. Humaniza-se.
No livro “Guia dos remédios caseiros para a depressão” editado, pela primeira vez, em 2002, através da Plátano Editora, diversas autoridades mundiais deixam variados conselhos para a remediar. De uma forma simples estão disponíveis mais de cem indicações acerca do humor, da dieta, do pensamento e da descontracção.
A toma do floral Mustard (para quando não há causa conhecida) ou dar um passeio são algumas das formas de a aliviar. O ideal é usar o Sábado, dia tradicionalmente dedicado ao descanso, para fazer o processamento das ocorrências da semana; aproveitá-lo para perdoar a si e ao outro, numa atitude de (auto)conhecimento e compreensão (mútua). Dessa forma, os detritos dos pensamentos, emoções e acções semanais não se acumularão fazendo-se repercutir mais tarde.
Tal não quer dizer que se esteja curado. Ninguém se pode livrar da depressão, como não se pode anular a noite ou o Inverno. São partes inseparáveis do universo e estão ali como reserva de energia e valor do dia ou do Verão. Não são inimigos - antes pelo contrário. Os sentimentos e pensamentos que nos fazem viver são essenciais ao crescimento. Sem eles, jamais o Ser Humano evoluiria e progrediria, pois é nas fraquezas que se reforça a vontade de existir.
A depressão é como um sinal de alerta. Ela guia, conduz e orienta. Querer escondê-la através de anti-depressivos, por exemplo, seria como continuar a conduzir um carro cujas luzes de alerta se cortam, só para ocultar que o vermelho nos indique sinal de perigo. Os sintomas depressivos devem, pois, serem levados em conta e lidos como formas de prevenção para doenças posteriores e mais graves. O perigo está na resistência.
As mulheres, que tendem a ser mais depressivas, têm nos Sintomas Pré-Menstruais vários tipos de depressão que, nessa época, se manifestam com mais vigor. Será uma altura adaptada para efectuar a limpeza das dores do corpo emocional. Também as pessoas de sangue negativo, de carácter mais introvertido, passivo e reflectido, serão mais propícias aos estados de prostração. Igualmente os indivíduos com baixos níveis de serotonina (cujo precursor é o triptofano), libertada com o sol, por exemplo, tendem aos estados de crise.

Animar

Quem não deprime sobrevive à superfície e na periferia do (seu) mundo. Nem sempre estar bem-disposto é sinal de felicidade. É preciso ser forte para dizer “sim” ao desafio que representa a depressão, estar ou ir para baixo, para a fossa, como se diz no Brasil, e ter a coragem de ir ao fundo de si próprio.
O desafio é comunicar consigo, estar à vontade com o seu lado mais sombrio, lunar e vulnerável. É ser capaz de estabelecer intimidade consigo e compreender, aceitar e respeitar o que se (não) é, o que se (não) quer, o que se (não) deseja. É ser capaz de se re-conhecer e agir de acordo com a consciência, agora mais afinada.
A depressão corresponde a um momento de vida (mais) subjectiva e passiva, um espaço de silêncio (externo) para uma pausa e introspecção, para se sentir, dos medos aos desejos, os estados de alma não mediatos. Parar é morrer, por momentos, para a vida mais objectiva, exterior e agitada. É actualizar-se com a sua realidade interna. É encarar as raivas, ódios, rancores e mágoas, escondidos ao longo dos dias, e expressá-los (através da escrita, da fala, da arte ou mesmo das lágrimas). Dessa forma se extinguem e desaparecem. O seu lugar deixará espaço disponível, doravante, para a bondade e o amor.
As nódoas foram purificadas, as disfunções reconhecidas, a dor ultrapassada. E a cada vale superado é melhor a preparação para os futuros afundanços. Sem saltar ou fugir dos sentimentos, fortalecidos pela dor tornada alegria, e o desencanto alquimizado em estímulo, haverá mais cabimento para o perdão, a compaixão, a comunhão, a ternura, a serenidade, a paz e até a alegria.
Mas se o prolongamento excessivo da depressão é um risco, a restauração precipitada e prematura do ânimo também não é benéfica. Cada um terá o tempo ajustado de sentir a revitalização natural acontecer, sentindo-se amenizado e reforçado. E, contudo, remanescerão sempre nódoas que por mais que sejam lavadas, deixarão marcas que ficarão para uma próxima lavagem, num programa mais apropriado ou, quem, sabe, necessitem de ser lavadas à mão e secas ao Sol.

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