Condicionar o ar?
Mais importante do que o dinheiro, o amor, ou mesmo a água. O ar. Existe naturalmente, mas nós condicionamo-lo. O seu abuso agrava a poluição.
Não há nada de mais precioso. Venerado como um dos principais elementos da Vida, em sociedades antigas, onde os Silfos, elementais do Ar, eram respeitados, o ar é hoje desvalorizado.
Além de respirarmos superficial, rapidamente e sem consciência, também já pouco exalamos ao ar livre e menos ainda ao ar puro. No entanto, é do ar que depende a nossa qualidade de vida. Literalmente. É dele que dependemos, desde que nascemos. Sem ele, nada do que consideramos mais importante resistiria.
Sobre o ar deveria recair, então, a nossa maior e melhor atenção. É um dos nossos direitos mais básicos. Mas também um dos deveres primordiais, ao nível de um comportamento sustentável, de responsabilidade para com as gerações vindouras. Deixar-lhes, ao menos, ar puro e livre, para poderem não apenas sobreviver, mas também viver condignamente.
Ao invés da preocupação com esta herança fundamental, nem sequer nos atendemos a nós próprios. Como tudo o que é realmente importante, é discreto, invisível e gratuito. Mas nós desbaratamo-lo.
Depois de desequilibrarmos a Natureza, refugiamo-nos em autênticas redomas de vidro para não vermos o resultado das nossas acções. Fechamos janelas, acendemos a luz e, já quase automaticamente, ligamos o ar… condicionado. Condicionamo-lo à nossa comodidade. Esquecemos o resto: as causas e as consequências.
Os efeitos ambientais
Porque preferimos nós respirar ar condicionado? Fará melhor? Será melhor? Sentir-nos-emos uma espécie de Pavana, o antigo Senhor do Ar, que o regula à mercê dos seus desejos? Só que esse poder, ilegítimo e mal usado, virar-se-á contra o seu usuário. É o que está a acontecer.
Num momento em que o país tem de economizar recursos, tanto económicos quanto energéticos e ambientais, usamos mal e/ou abusamos do ar que condicionamos. Deixamo-lo ligado horas a fio já sem dele necessitarmos, depois de ‘lá fora’ se ter atingido a temperatura que nós, ‘aqui dentro’, consideramos ideal. Numa altura em que a palavra de ordem é economizar, nós desperdiçamos.
Sem o resolver (apenas mascaramos) agravamos o problema: consumimos mais energia. Para a repor entramos num ciclo vicioso: mais gastos, mais necessidade de recursos, mais depauperação, mais alterações climáticas, mais abuso… O que leva a mais necessidades artificiais e ao consumo de mais energia, para a qual se delapidará ainda mais património natural desgastando assim a natureza que, um dia, mais cedo ou mais tarde, manifestará o desequilíbrio criado.
Outra consciência ambiental já comum é a necessidade de evitarmos os gases que destroem a camada de ozono, que nos protege dos raios ultravioletas. Pois bem, o ar condicionado é um dos principais responsáveis pela utilização desses gases compostos de síntese à base de cloro, bromo e flúor.
Os efeitos no Ser Humano e social
Além dos efeitos económicos e ambientais, há outros (mais) imediatos, visíveis e audíveis. A tosse, a irritação da garganta, olhos, nariz, as dores de cabeça, as alergias, as constipações. Enfim, cada um reage de acordo com sua parte mais sensível.
É sabido que a falta, escassez ou deficiência na manutenção dos aparelhos de ar condicionado são campo para o desenvolvimento de fungos e bactérias, transmissão de infecções respiratórias, tal como para a
acidificação do sangue. A causa está na deficiente presença de oxigénio e na falta de oxigenação em proporções naturais. Tal resulta do desgaste do organismo devido ao ácido láctico que é descarregado na circulação sanguínea, por graça da decomposição da glucose que origina a produção de ácido pirúvico. A acidez no sangue por sua vez causará, entre outros efeitos, deficiência imunológica, aumento dos radicais livres e fungos, envelhecimento prematuro, problemas hormonais, cardiovasculares, de bexiga; pedra nos rins, diabetes, osteoporose, obesidade, fadiga crónica, rápida exaustão, tendências depressivas, digestão lenta, úlceras, gastrite; dores musculares, de cabeça e de dentes, inflamação da córnea, pálpebra e gengivas, pele seca e unhas e cabelos quebradiços.
Um dos problemas é a falta de alternativa. Para quem sofre os efeitos do ar artificial no organismo, sente uma opressão social, pois ele é hoje presença obrigatória em quase todos os estabelecimentos, públicos e privados, que nem as mercearias escapam. Trata-se de uma verdadeira questão de saúde pública.
Enquanto em relação ao tabaco já há um aumento da consciência quanto aos malefícios, um retrocesso no que toca à imagem socialmente favorável de quem puxava pelo cigarro, uma onda de apoio crescente em termos legislativos e cada vez mais locais reservados a não fumadores, no que diz respeito ao ar condicionado tal não acontece. Ainda se está na maré de opinião pública crescente em que se usa sem conhecer as consequências.
Por outro lado, enquanto nos elevadores é fácil para o consumidor verificar a manutenção feita, no caso dos aparelhos de ar condicionado não há como confirmar o estado dos filtros. A única coisa a que os utilizadores forçados têm acesso é, muitas vezes, ao aspecto pouco higiénico dos cabos e contentores. Algumas vezes nem sequer se limpa o espaço, no mais básico que a limpeza tem, mas há sempre um moderno aparelho de ar para se ligar. Não custa quase nada. Aparentemente e no curto prazo, apenas.
Sacrifica-se o saber bem, a sensação de um desejo hedonisticamente cumprido, de parecer bem, ao fazer bem à saúde. Consideramos então muito “in” andar de mangas curtas em pleno Inverno e, no Verão, de mangas cumpridas. Rejeitamos o clima que a natureza tão graciosamente nos oferece, para desejarmos quase sempre o contrário. Vivemos, assim, numa insatisfação permanente, querendo quase sempre o contrário da temperatura que temos de forma natural. Mas haverá prazer maior que desfrutar o ar quente do Verão e, depois, o frio do Inverno, ou vice-versa? O quente e o frio é tão natural e importante como o dia e a noite, o homem e a mulher. Sem um deles, a vida seria absurda e impossível.
Neste momento, o ar condicionado corre o risco de se juntar a uma lista de dependências (sociais), como o tabaco ou o café. Primeiro o organismo rejeita e reage, depois habitua-se e a dependência instala-se. Os estragos virão mais tarde, até um dia a doença se manifestar.
A ilusão técnica
Tudo o que fazemos é uma expressão daquilo que somos. Ao condicionar o ar não estamos mais do que a auto-limitar a nossa essência vital. Prendemos o ar, como a água. A acção incauta e ambição humana parece tocar a consciência, levando o Ser Humano a necessitar de compensar com reservas para o futuro os recursos que, consumidos de forma frugal, seriam mais que suficientes no presente.
A técnica, porém, dá-nos a ilusão de que podemos continuar a poluir o ar natural e que deste haverá sempre forma de o filtrar. A fantasia de viver quase permanentemente em ar artificial, ainda que uma vez por outra lá se tenha de enfrentar as quatro estações naquelas poucas vezes em que ainda saímos à rua e nos confrontamos com o sol, a chuva, a terra ou o ar. Às vezes, já sob a forma de ondas de calor, inundações, tremores de terra ou incêndios. Esquecendo os nossos gestos, limpamos daí as mãos, a nossa responsabilidade, individual e colectiva.
A ideia de que podemos poluir à vontade, que depois haverá uma qualquer técnica que nos dará os elementos básicos à nossa sobrevivência, limpos e puros, pode ser muito cómoda mas é insustentável. Tudo aquilo que fizermos à Natureza e aos seus elementos, mais cedo ou mais tarde, ela nos devolverá. Em “feedback”. Aqui, agora, ou ali, depois. Mas inevitavelmente.
Cada vez que optamos por ligar o ar condicionado estamos a agravar o problema das alterações climáticas. É como lançar ainda mais lenha para a fogueira. E o que se quer é apagá-la. A continuar assim, somos muito mais condicionados pelo ar do que o condicionamos, na verdade.
Quem o vê, em janelas e prédios em toda a parte, parece que não tem concorrentes. Mas eles ainda existem e são mais eficazes, baratos e saudáveis. Tudo começa pela qualidade da construção dos prédios, o uso de persianas no Verão, e as velhinhas ventoinhas. Podemos ainda optar por uma via mais ecológica: a sombra de uma árvore, no calor, ou o uso de roupas mais quentes, durante o frio.
Um uso adequado, controlado da nova técnica pode ser, no entanto, legítimo na defesa de vidas humanas. Tratar-se-ia de um uso racional, pontual, em vez de um abuso emocional, quotidiano.
Um uso adequado, controlado da nova técnica pode ser, no entanto, legítimo na defesa de vidas humanas. Tratar-se-ia de um uso racional, pontual, em vez de um abuso emocional, quotidiano.
Etiquetas: Ar condicionado, Dina Cristo, Opinião
2 Commentarios:
Tomo a liberdade de vos enviar um excerto do artigo “Como ser uma EcoFamília”, publicado no último número da QuercusAmbiente (Nov./Dezembro, p.11), relativo ao ar condicionado:
«O crescimento do consumo de energia eléctrica no sector doméstico deve-se em grande parte à aquisição de aparelhos de ar condicionado. Contudo, é sempre preferível recorrer antes aos métodos de climatização passiva mais económicos. Um exemplo prático é, no Verão, correr os estores durante o dia e, ao cair da noite, deixar as janelas abertas, para que o ar frio nocturno entre e circule na casa. No Inverno deve deixar os estores abertos nas janelas onde o sol incide mais, de modo a contribuir para o aquecimento da casa.
Caso seja mesmo necessária a aquisição do equipamento de ar condicionado, tenha sempre em conta a etiqueta energética, escolhendo um aparelho de classe A. Não menos importante é verificar se a potência do equipamento é adequada relativamente à área da divisão onde o vai instalar.
Saiba também que por cada grau a menos (arrefecimento) ou a mais (aquecimento) de temperatura relativamente à temperatura ambiente, se verifica um aumento de 3 a 5% no consumo de energia.
Se for construir uma casa, aposte numa construção mais eficiente, com uma boa orientação solar e um bom isolamento, para que não sejam necessários sistemas de climatização».
Entretanto, se consultarmos o projecto EcoCasa (em http://www.ecocasa.org/projecto1.php), podemos verificar, no ponto relativo ao ar condicionado, o seguinte:
«Estes sistemas começaram por ser concebidos para gerar ar frio, mas actualmente existem muitos modelos que produzem tanto ar frio como ar quente. Presentemente a função de desumidificar também está presente na generalidade dos equipamentos.
Na função de aquecimento é preciso ter em atenção a energia eléctrica consumida para a quantidade de calor produzido.
Estes equipamentos nem sempre fazem uma renovação do ar, apenas o ventilam, por isso a presença de um bom sistema de filtragem é essencial para que não se verifique uma deterioração do ar.
A capacidade calorífica é sempre superior à capacidade frigorífica.
COP indica o coeficiente de rendimento e traduz a relação entre a energia (térmica) produzida pelo aparelho e a energia eléctrica absorvida (consumida) para o efeito. Quanto maior for este valor, mais eficiente será o aparelho, logo menores custos operacionais. A grande maioria dos aparelhos tem um valor de COP superior a 3. Quanto mais elevado for o COP melhor será a eficiência energética.
No caso de optar por este tipo de equipamento tem que pensar nas opções que se apresentam: um sistema com duas componentes ou só uma, e se quer um equipamento móvel (tenha em atenção o peso do equipamento) ou não.»
Felicitações para o vosso projecto.
É uma arma "maravilhosa"! Agora para espalhar o vírus da gripe é "fantástica". Para quê guerras?
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