quarta-feira, 13 de março de 2013

Tecnologia?


Domingo é Dia Zeitgeist. Após o primeiro, segundo e terceiro filmes, dedicamo-nos hoje a um dos temas mais focados na trilogia.
Texto e fotografia Dina Cristo
O universo humano tem evoluído desde a era mitológica, cuja referência eram os Deuses, para a era teológica, cujo sentido era dado por Deus, até à era tecnológica (do retorno da Deusa). Aqui a fé é posta na invenção humana: depois dos utensílios, para produção, e dos instrumentos, para percepção, os dispositivos, para automação, são hoje o centro das atenções, aos quais o Ser Humano se devota e sacrifica, incluindo os seus recursos.
A crença na ordem performativa para resolução dos problemas humanos, o predomínio de técnicos no sistema socioeconómico, o culto e idolatria técn(ológ)ica, dissimulada pela sua “neutralização”, ‘naturalização’ e miniaturização, geraram a dependência técnica, a tecnofilia, a alienação do Ser Humano e a sua separação do mundo natural, como João Afonso retrata em “Ainda há caracóis”, do seu álbum “Zanzibar”, de 2002.
Este conhecimento, que visa o interesse do próprio sujeito e a sua utilidade imediata, ao contrário do desinteresse da “theoria” e do desapego da “aletheia”, recebeu, nos últimos séculos, a confiança de homens e mulheres, que nele depositaram a sua esperança na libertação, incluindo do esforço despendido, das actividades físicas às mais mentais, e de que o uso da máquina de calcular é exemplar.
Este crédito desenvolveu-se de tal forma que aquilo que começou como um meio (técnico) se tem transformado nos próprios fins – que são humanos; quando tal substituição se dá, alertava Max Weber, o mundo torna-se uma “gaiola de ferro”. Ao contrário da promessa de emancipação, ocorre o aprisionamento e, no caso da própria ordem simbólica, do discurso, fica também ela refém da competência técnica, como explica Adriano Duarte Rodrigues, no âmbito da logotécnica.
A penetração, o excesso e a imposição do mundo mecânico sobre o orgânico, dos fenómenos naturais, têm conduzido algumas pessoas e comunidades, pelo contrário, a uma reacção de tecnofobia, à dispensa e rejeição dos objectos técnicos.
Riscos técnicos
Apesar da técnica, como depois a tecnologia, ser sinal de desenvolvimento da racionalidade humana, desde a Revolução do Neolítico, se o pensamento não for devidamente acompanhado pelo aperfeiçoamento emocional e comportamento moral, como aconteceu com civilizações mais antigas, conforme alertou Omraam Aivanhov, tal, além de ser sinónimo de regressão, é perigoso e pode tornar-se igualmente (auto)destrutivo.
O menor esforço exigido, o maior conforto proporcionado, o crescimento da autonomia dos dispositivos e, simultaneamente, mais sujeição dos usuários, pode gerar a preguiça, a desatenção, a imprudência e o descuidar do autodomínio, explicava Omraam; além da menor independência humana, vigilância e discernimento, o mundo artificial contém o risco de promover a irresponsabilidade (como no caso da saúde), da irreflexão e mesmo do enfraquecimento do Ser Humano.
Ao contrário das pedras, plantas, animais e humanos, que se decompõem naturalmente, os resíduos técnicos poluem a Natureza. Além do mais, ao aumentar a quantidade e a velocidade geram excesso e desperdício que muitas vezes é sentido como insuficiência e escassez. O caso da obsolescência dos produtos e as sobras de produção de alimentos depois “enterrados” são disso exemplos.
Uso moderado
Entre a tecnofilia e a tecnofobia, para além da ilusão, da sedução técnica e do seu abuso ou mau uso, há hoje a consciência de que existe tecnologia suficiente para, finalmente, as colocar ao serviço das necessidades humanas e em colaboração com as leis naturais, num vórtex de abundância, paz e amor, com a forma a exprimir a vida, em detrimento da competição, do poder e do desrespeito em relação ao mundo natural.
Para além da alta tecnologia, da alta definição (meio quente) e da digital, há hoje vontade de promover a tecnologia média ou baixa, a “low technology”, livre, de “open source”, em pequena escala, a nanotecnologia, ou de carácter mais social. No caso de Tamera, existem experiências implementadas ao nível da descentralização e do auto-abastecimento, com base nos recursos naturais. Ao nível do movimento Zeitgeist, para além do projecto Vénus, de carácter mais ambicioso, “Aurora” documenta a defesa de uma tecnologia que satisfaça as necessidades de todos os indivíduos, sem desperdícios, através de uma gestão eficaz, científica, dos recursos.
Para além da reprodução, multiplicação, racionalização e reversibilidade, de meios de substituição (as próteses) ou melhoramento (as órteses), pode gerar-se verdadeira evolução e progresso técnico, com realização das potencialidades de (re)crição humana sem colapso, devastação ou desordem. Para o Centro de Pesquisa pela Paz, no Alentejo, o conhecimento tecnológico permitirá (re)unir aquilo que tem vindo a ser separado: o mundo que os humanos herdaram e o que criaram, sob cooperação, doravante, em benefício da Natureza e da própria Humanidade.

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