quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Teosofia


Helena Petrovna Blavatsky


Esta semana assinalam-se 135 anos do Movimento Teosófico moderno - oportunidade para desfolharmos um pouco da sua história, (re)conhecermos as suas individualidades e actuação também em Portugal.


Texto Joaquim Soares


Na sua essência, o movimento teosófico tem a origem na noite dos tempos. Ele é invisível e a sua acção pode ser notada ao longo de toda a história humana, em todos os tempos e lugares. Ele começou no Mundo Espiritual superior e os seus efeitos podem ser observados, século após século, na contínua luta pela liberdade de pensamento, no labor abnegado pela evolução moral da humanidade, na destemida afirmação dos valores do espírito, da dignidade do ser humano e do valor sagrado da vida. Ele é o meio de expressão no mundo da Sabedoria Divina, ou Teosofia, presente nas grandes religiões e filosofias e nas principais ciências da humanidade.
Para a nossa era e geração actual, o movimento teosófico, ou a escola moderna de Teosofia, foi criado há 135 anos. No dia sete de Setembro de 1875, uma terça-feira, dezassete pessoas reuniram-se na residência de Helena Petrovna Blavatsky [1] em Nova Iorque, para ouvirem uma palestra de George Henry Felt sobre os mistérios antigos, intitulada “O Cânone Perdido das Proporções, dos Egípcios, Gregos e Romanos”. Após um intenso debate, Henry Olcott, lançou a proposta de criar uma Sociedade para que se pudesse continuar aqueles estudos. Nessa mesma reunião, Henry S. Olcott foi eleito presidente e William Q. Judge eleito secretário. [2]
Os seus três objectivos declarados são até hoje os seguintes: I – Formar o núcleo de uma Fraternidade Universal da Humanidade, sem distinção de raça, credo, sexo, casta ou cor; II – O estudo de religiões, filosofias e ciências antigas e modernas, e a demonstração da importância de tal estudo; III – A investigação das leis inexplicadas da Natureza e dos poderes psíquicos latentes no homem;[3]
O movimento teosófico adoptou também o antigo lema do Marajá de Benares, na Índia, que é originalmente em sânscrito: “Satyat Nasti Paro Dharma”. Helena Blavatsky faz a seguinte tradução na edição original de “A Doutrina Secreta”: “Não há religião (ou lei) mais elevada que a verdade”[4].
As bases do movimento teosófico moderno foram lançadas essencialmente entre 1875 e 1891, quando morre H.P.Blavatsky (HPB). Esta notável mulher foi autora das mais maravilhosas e profundas obras de Filosofia Esotérica – ou Teosofia –, sem paralelo na história da literatura filosófica dos últimos dois mil e quinhentos anos. A obra de HPB é uma referência confiável para aqueles que se esforçam por percorrer com seriedade o caminho espiritual. O estabelecimento do movimento teosófico foi, sem dúvida, a sua principal herança, a sua verdadeira obra-prima, a sua maior dádiva à humanidade.
Pouco tempo depois da sua fundação em Nova Iorque, o mesmo movimento universalista surge na Índia, em Adyar. É preciso, no entanto, ter em consideração que não existe hoje nenhuma instituição que detenha o monopólio da Teosofia ou do movimento teosófico.
Como escreveu William Judge: “Há uma diferença muito grande entre o Movimento Teosófico e qualquer Sociedade Teosófica. O Movimento é moral, ético, espiritual, universal, invisível excepto nos seus efeitos, e contínuo. Uma Sociedade formada para o trabalho teosófico é uma organização visível, um efeito, uma máquina para conservar energia e para colocá-la em acção; ela não é nem pode ser universal, nem é contínua. As corporações teosóficas organizadas são feitas pelos homens para uma melhor cooperação, mas, como são meras cascas externas, elas devem mudar de tempos em tempos à medida que as falhas humanas aparecem, à medida que os tempos mudam, e à medida que o grande movimento espiritual subjacente provoca tais alterações.” [5]
O movimento é amplo e diversificado: ele contempla diversas linhas e propostas de trabalho, e não está preso a nomes ou corporações. Sabemos que ao nível do plano oculto, nada está separado no movimento esotérico.


Correntes (inter)nacionais

As três principais tendências do movimento são hoje a Sociedade Teosófica (ST) de Adyar, a Sociedade Teosófica de Pasadena e a Loja Unida de Teosofistas (L.U.T). A ST de Adyar congrega entre 80 a 90 por cento dos milhares de estudantes teosofistas do mundo, seguida da L.U.T, que está presente em 15 países e, por fim, da ST de Pasadena, presente em 9 ou 10 países. Para além destas três linhas de trabalho principais, existem depois várias outras pequenas associações e grupos de estudantes significativos, importantes, espalhados por vários países do mundo.
Em Portugal, o movimento teosófico teve a sua primeira aparição através da obra do pensador Frederico Francisco Stuart e Mourão (1827 – 1908), o Visconde de Figanière. Discípulo directo e colaborador de Helena Blavatsky, Figanière foi o grande pioneiro da teosofia moderna em língua portuguesa.
Em 1889, Figanière escrevia na sua obra “Estudos Esotéricos: Submundo, Mundo, Supramundo” palavras proféticas: “O materialismo é uma das aberrações do século. A sociedade expectante está dando sinais de impaciência e de cansaço. (…) Quando as duas irmãs – como as chama o professor Huxley – quando a Religião e a Ciência se congraçarem, prestando-se mútuo auxilio com a Filosofia de permeio (um ternário ou trindade, como em toda a potência que se manifeste) é de crer que se repita, com variante, o que já, mais de uma vez, se tem realizado neste mundo, se não mentem as vozes vindas de longe.” [6]
Em 1921, é criada em nosso país a primeira secção nacional da Sociedade Teosófica de Adyar. Em 1990, é feito algum trabalho por um pequeno grupo de estudos da L.U.T. Em 2010, surge publicamente em Portugal pela primeira vez a Loja Luso-Brasileira da L.U.T., que pretende, de certo modo, resgatar e valorizar o esforço pioneiro do Visconde de Figanière.
É importante referir que “a Teosofia, como filosofia abstracta e universal, desdobra-se na prática e no dia-a-dia através de um amplo Movimento Teosófico onde não faltam desafios e limitações humanas.” [7] Sendo um movimento humano, significa que tem em si verdades e ilusões, a letra morta e o espírito que vivifica, significando que erros do passado precisam ser corrigidos, propostas fantasiosas devem ser abandonadas e quaisquer processos burocráticos e autoritários necessitam ser extinguidos. O movimento teosófico funciona, afinal, como o grande meio de provação, teste e aprendizagem para os estudantes de teosofia.
Em 135 anos, o movimento teosófico influenciou o pensamento humano em muitas áreas. [8] Sendo um movimento de ideias, é notório que a sua missão está muito longe de estar cumprida.
Na sua obra “A Chave Para a Teosofia” H.P.B. faz a seguinte descrição: “Se o movimento teosófico fosse mais um dos numerosos modismos de hoje em dia, que são no final das contas tão inofensivos quanto evanescentes, ele seria simplesmente um motivo de riso (...), e seria deixado de lado. Mas a verdade é muito diferente. Intrinsecamente, a teosofia é o movimento mais sério da era actual; e um movimento, além disso, que ameaça a própria existência da maior parte das falsificações, dos preconceitos e dos males sociais da actualidade, todos legitimados pela tradição; males que engordam e tornam felizes a minoria dominante e os seus imitadores e bajuladores - os pouco numerosos membros da classe média alta - ao mesmo tempo que claramente esmagam e fazem passar fome milhões de pobres.” [9]
A tarefa do movimento teosófico não é de curto prazo. A sua função é plantar as bases da futura civilização planetária. Como escreveu um estudante: “O verdadeiro movimento teosófico, que é maior do que quaisquer rótulos externos, está presente onde quer que emerja e actue a nova consciência planetária baseada na busca da verdade sem dogmas, na solidariedade universal e na fraternidade sem fronteiras.” [10].



[1] Ler “Helena Blavatsky – A Sabedoria Universal”, José Manuel Anacleto, Biosofia n.º1, Lisboa, 1999, pp.20-24. Aconselhamos igualmente a leitura da excelente biografia “Helena Blavatsky – A Vida e a Influência Extraordinária da Fundadora do Movimento Teosófico Moderno”, de Sylvia Cranston, Ed. Teosófica, Brasília. [2] Adaptação do texto “Sete de Setembro em Nova Iorque”, no website www.filosofiaesoterica.com . [3] Texto traduzido da contracapa do livreto “Work for Theosophy - Articles by William Q. Judge”, The Theosophy Company, Los Angeles, Califórnia, EUA, 48 pp. [4] “The Secret Doctrine”, H.P. Blavatsky, Theosophy Company, Los Angeles, 1982, volume I, p. xli. A edição brasileira neste ponto não é perfeitamente fiel ao original: “A Doutrina Secreta”, Ed. Pensamento, volume I, p. 64. [5] Do texto “O Movimento Teosófico – Interesses Corporativos Não Controlam a Sabedoria Universal”, do website www.filosofiaesoterica.com. [6] “Estudos Esotéricos: Submundo, Mundo, Supramundo”, Livraria Internacional de Ernesto Chardron, Porto, 1889, 744 pp., Capítulo I, “Introdução”, pp.31-32. Esta obra teve uma edição brasileira que publicou apenas parte do seu conteúdo. Trata-se de “Submundo, Mundo e Supramundo”, Visconde de Figanière, Editora Três, Biblioteca Planeta, São Paulo, 298 pp., 1973. Veja-se outro texto de Figanière intitulado “
A Palavra e o Pensamento”, publicado no website http://www.vislumbresdaoutramargem.com/. [7] Do textoA Teosofia e o Movimento Teosófico”, do website http://www.filosofiaesoterica.com/. [8] Ler “Helena Blavatsky – A Vida e a Influência Extraordinária da Fundadora do Movimento Teosófico Moderno”, de Sylvia Cranston, Ed. Teosófica, Brasília. [9] Traduzido directamente de “The Key to Theosophy”, H.P.Blavatsky, Theosophy Co., Mumbai, Índia, p. 269. Na edição em língua portuguesa de “A Chave Para a Teosofia” (Ed. Teosófica), veja p. 233. [10] Do texto “Sete de Setembro em Nova Iorque”, no website http://www.filosofiaesoterica.com/

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