quarta-feira, 22 de abril de 2009

Forte beleza


Vista da Fortaleza
Perto do 25 de Abril e alguns dias após o Dia Internacional dos Monumentos (DIM) recordamos um que foi prisão política em Portugal e é, há um quarto de século, Museu da Resistência. Trata-se da fortaleza de Peniche - que está a comemorar 400 anos da elevação a cidade - agora projectada para se transformar em pousada, com a apreensão da Associação Não Apaguem a Memória. Uma história secular evocada num texto escrito há mais de duas décadas.


Texto e fotografia Dina Cristo

As muralhas elevam-se sobre rocha, recortam no céu o perfil estranho das ameias e baluartes. Esta maciça e altiva construção tem cerca de 20 mil m2, é composta por quatro frentes regularmente baluartadas nos vértices, no entanto, a restante linha marginal segue as ondulações das rochas escarpadas, que constituem a sua base.
A ligação definitiva da ilha de Peniche ao continente provocou uma profunda transformação na distribuição demográfica, organização social e valorização económica da vila. No séc.XV (altura em que Peniche sofre o repovoamento) Portugal dispunha de quatro locais pelos quais facilmente se desembarcava: Chaves, Peniche, os rios Tejo e Guadiana. Destas áreas era efectivamente Peniche que apresentava maiores facilidades de acesso, permitindo o desembarque de muitos milhares de combatentes, independentemente do estado do tempo.
Portugal via-se constantemente ameaçado pelos corsários, prontos ao assalto e traficância, tal como os barcos inimigos que aproavam à terra com o objectivo de derrotar as forças portuguesas, destruindo e furtando no mínimo os bens dos habitantes. Estes, muito indefesos, eram na maior parte transformados reféns no mercado de escravos.
Assim desprotegida, Peniche representava um grave perigo no domínio político-militar, uma vez que se situava próximo de locais de alto valor estratégico e era habitat de grande parte da nossa população.
Mas após tantos séculos, o sonho tornar-se-ia realidade, começando a ser palpável a resposta ao problema defensivo do qual o litoral tanto carecia. Finalmente, chegado que era o ano de 1557, D. João III concretizava a idealização do seu pai. Aliás, já no séc.XV D. Manuel havia mandado construir um pequeno castelo.
Quatro séculos e meio A primeira construção a tomar formas palpáveis e precisas foi o redondo, terminado logo em 1558, já no reinado de D. Sebastião. A obra foi orientada por D. Luís de Ataíde, que teve igualmente a seu cargo as obras adjacentes. Até 1567 a edificação era constituída pela dita torre e a muralha a sul – de modo a poder receber guarnições. Entretanto, para fazer face às despesas, são lançados (entre 1567 e 1577) impostos sobre o pescado.
O forte seria interrompido entre 1568 e 1572, durante a ausência do nosso Vice-Rei na Índia, tal como em 1577, altura em que o traçado ficou algo semelhante ao actual. Após o seu término parcial, serviu no combate das tropas inglesas aquando do desembarque de 12 mil homens postos à disposição de D. António Prior do Crato – na sua tentativa infundada de derrube à intrusão filipina.
Aquando do reinado dos Filipes são construídos alguns redutos – fase concluída já no reinado de D. João IV, desta feita sob as ordens de D. Jerónimo de Ataíde.
O sistema fica terminado em 1645 (sem atingir os dois mil réis), posteriormente ampliado e aperfeiçoado consoante as necessidades. E foi no termo da edificação que Peniche foi considerada uma praça de guerra de primeira ordem, governada de início por um general e mais tarde por um coronel.
Cinco anos mais tarde Nicolau de Langres traça a planta do muralhamento oriental, construído nas suas linhas gerais e durante algumas décadas.
A cintura das muralhas ficara concluída com a edificação ulterior dos fortes, baluartes, baterias e alguns entrincheiramentos. Mais tarde, durante oito meses na primeira década do séc.XIX, a fortaleza sofre as agruras da invasão francesa, embora Junot, por um mal entendido, mande restaurar algumas áreas.
Mas a cidadela foi ainda objecto de trabalho por parte de reis portugueses como D. Miguel e D. Luís tal como pelo marechal Beresford.
Ao longo do século começa a ultrapassar o seu passado militar uma vez que se torna depósito prisional. Por lá passaram franceses encarcerados pelos miguelistas, boers, prisioneiros alemães, políticos opositores do regime do Estado Novo e depois político-policiais do mesmo e, finalmente, famílias retornadas.
Definitivamente liberta a cidadela, é assumida pela Câmara a responsabilidade da sua dinamização e integração na vida dos cidadãos sendo palco de várias manifestações culturais.

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