The Cree community
Numa semana que irá assinalar o Dia da Cultura Indígena, apresentamos um cheirinho sobre a comunidade Cree, nativos Woodland de Hudson Bay, Canadá. O texto, em inglês (com tradução em comentário), insere-se numa investigação de mestrado, cuja continuidade, ao nível de doutoramento, levou a autora já este ano a visitar reservas, museus, centros e a contactar a escritora nativa Jeannette Armstrong.
Texto e fotografia Susana Amante
It is now common sense that the nomenclature “Indian” resulted from the miscalculation of an early European explorer’s desire[1] of discovering the sea-route to India. Consequently, the various communities, each one with their particular habits, ways of living and languages, were christened in their own land, being labelled under this same racist[2] name.
Texto e fotografia Susana Amante
It is now common sense that the nomenclature “Indian” resulted from the miscalculation of an early European explorer’s desire[1] of discovering the sea-route to India. Consequently, the various communities, each one with their particular habits, ways of living and languages, were christened in their own land, being labelled under this same racist[2] name.
However, even recognising each tribe’s uniqueness, it is an unquestionable truth that some of them have shared common traits, traditions and beliefs, as it is the case of the Woodland Natives, to which the Cree belonged.
From a broad point of view, the Cree community led a nomadic lifestyle, travelling to and from harvesting areas and living off the land, for most of the year. Winter was the trapping season and, thus, during those months, hunters followed game, including caribou herds, moose, beaver and buffalo. During summer time, they harvested and preserved fish, berries and other food staples.
Due to the fact that nature provided everything they needed, the native communities regarded the Mother Earth as being invested with sacred meaning. Contrary to the white individuals, who have tended to view human beings as having dominion over all the creatures on soil, sea and sky, the First Nations have not considered themselves as the brute masters of creation, but as the brothers of all life, as Miller (1991: 466) declares: «The non-natives (…) believe the world is God’s gift to them to exploit. From a different tradition native Canadians have acquired a contrasting outlook. They see humans as merely one of the creatures with whom they are interconnected. If they are created in the Great Spirit’s image, then so too are the beaver, streams, and forests. (…) Indigenous peoples and European newcomers hold to profoundly different views of the world and the place of humans in it: the former are cooperative and compatible with the environment, the latter competitive and destructive».
Spiritual worldview
What is more, as noted in the quotation above, Indigenous people, and the Cree in particular, have relied upon the existence of a creative force, the Great Spirit, whom, due to the genderless nature of Cree linguistics, is both female and male, because she/he can only be referred to in non-gendered terms. They have also believed in manitous, that is, spirits wielding a powerful influence over human events and visiting tribal shamans in prophetic dreams and visions. In turn, these last entities, the shamans or medicinemen, rendered their services to tribesmen, performing miraculous deeds and cures, while conducting various kinds of ceremonies.
While referring to the spiritual worldview of the Indigenous peoples from Canada, one shall not forget the role of the Trickster, a clownish figure, who is the personification of human ambiguity and the celebration of life. This supernatural being has appeared in many legends and stories as a form of entertainment or instruction. In fact, it is important to stress that storytelling has been a cornerstone of the First Nations’ identity. As a consequence, folktales have been passed down through the generations “(t)o entertain listeners of all ages, to instruct the young, to preserve history and rituals and beliefs” inherent to each native community, as Clark (1967: xi) points out.
Just like the Earth, life itself and stories, whose circular structure is so common, time has also been regarded by native peoples as a nonlinear continuum, as opposed to the Euro-American thought.
Another aspect that we must retain is the importance of language, as a way of reclaiming the past and envisioning the future. Actually, a language is a vehicle of culture and, as a result, when a people lose their language, they tend to lose their cultural identity.Etiquetas: Sociedade, Susana Amante, The Cree community
1 Commentarios:
Actualmente, é do senso comum dizer-se que a nomenclatura “Índio” resulta de um erro de cálculo, motivado pelo desejo de um primeiro explorador europeu[1] de descobrir o caminho marítimo para a Índia. Consequentemente, as várias comunidades, cada uma com os seus costumes específicos, modos de vida e línguas diferentes, foram cristianizadas na sua própria terra e catalogadas sob a mesma designação racista[2]. Contudo, e mesmo reconhecendo as especificidades de cada tribo, é uma verdade inquestionável que algumas delas têm partilhado traços, tradições e crenças comuns, como é o caso dos Nativos de Woodland, aos quais os Cree pertenciam.
Sob um ponto de vista mais amplo, a comunidade Cree tinha um estilo de vida nómada, viajando de e para áreas cultiváveis e vivendo, grande parte do ano, do que a terra lhes proporcionava. O Inverno era a estação da caça e, por conseguinte, durante esses meses, os caçadores perseguiam as suas presas, nas quais se incluíam as manadas de caribus, alces, castores e búfalos. Durante o período de Verão, eles dedicavam-se às colheitas e à conservação de peixe, bagas e outros alimentos de primeira necessidade.
Devido ao facto de a natureza lhes providenciar tudo aquilo de que necessitavam, as comunidades nativas olhavam para a Mãe Natureza como se esta estivesse revestida de um significado sagrado. Contrariamente aos indivíduos não-nativos, que geralmente têm tendência a ver os humanos como tendo domínio sobre todas as outras criaturas da terra, do mar e do céu, as First Nations [comunidades nativas do Canadá] não se consideravam senhoras e donas da criação, mas sim como as irmãs de todas as formas de vida, como Miller (1991: 466) refere: «Os não-nativos (…) acreditam que o mundo é uma dádiva de Deus que lhes fora dada para eles poderem tirar partido. Devido a uma tradição distinta, os Nativos do Canadá adquiriram uma visão contrastante. Eles vêem os humanos como apenas uma das criaturas com as quais eles estão interligados. Se eles foram criados à imagem do Grande Espírito, então também o foram os castores, os riachos e as florestas. (…) Os povos Indígenas e os primeiros navegadores Europeus têm uma visão bastante diferente do mundo e do lugar que o ser humano nele ocupa: os primeiros são cooperantes e compatíveis com o meio ambiente, os segundos são competitivos e destrutivos».
Visão espiritual do mundo
É de referir que, conforme nos apercebemos na citação anterior, os povos Indígenas, e em particular os Cree, sempre confiaram na existência de uma força de criadora, o Grande Espírito, que – devido à natureza da língua Cree que não distingue os géneros – é simultaneamente feminino e masculino, porque ela/ele só pode ser referenciada/o sem recurso a qualquer especificação de género.
Eles [os nativos] também acreditavam em manitous, isto é, em espíritos que exerciam uma forte influência sobre os acontecimentos humanos e que visitavam os xamãs tribais em sonhos e visões proféticas. Por sua vez, estas últimas entidades, os xamãs ou curandeiros, prestavam os seus serviços aos membros das tribos, realizando feitos e curas miraculosas, enquanto executavam vários tipos de cerimónias.
Quando nos referimos à visão espiritual dos povos Índígenas do Canadá, não nos podemos esquecer do papel do Trickster, uma figura brincalhona e travessa, que é a personificação da ambiguidade humana e ao mesmo tempo a celebração da vida. Esta entidade sobrenatural aparece em muitas lendas e histórias como forma de entretenimento ou de ensinamento. De facto, é importante sublinhar que o acto de contar histórias tem sido um pilar da identidade das First Nations. Como consequência, essas histórias foram passadas de geração em geração “(p)ara entreter ouvintes de todas as idades, para instruir os mais novos, para preservar a história e os rituais e as crenças” inerentes a cada comunidade nativa, como Clark (1967: xi) refere.
Tal como o planeta Terra, a própria vida e as histórias, nos quais a estrutura circular é tão comum, o tempo também é visto pelos nativos como um continuum não linear, em oposição ao pensamento Euro-Americano.
Outro aspecto que também devemos reter é a importância da língua, como forma de reclamar o passado e de prever o futuro. Em boa verdade, a língua é um veículo de cultura e, como resultado, quando um povo perde a sua língua, tem tendência a perder a sua identidade cultural.
[1] O dito explorador e navegador Europeu foi Cristóvão Colombo e, de acordo coma obra de Tzvetan Todorov, The Conquest of America: The Question of the Other (1999: 10), “(i)nfinitamente mais que ouro, a expansão do Cristianismo era o desejo mais profundo de Colombo…”
[2] Do meu ponto de vista, apelidar as diversas comunidades Nativas como “Índias” foi uma prática racista, uma vez que isso implicou a separação de raças baseada em interesses políticos, económicos e culturais, pelos colonos das novas nações.
Obras citadas:
Clark, Ella Elizabeth. 1967. Indian Legends of Canada. Toronto: McClelland & Stewart Limited.
Miller, J.R. (ed.). 1991. Sweet Promises: A Reader on Indian-White Relations in Canada. Toronto: University of Toronto Press.
Todorov, Tzvetan. 1999. The Conquest of America: The Question of the Other. Norman: Univ. of Oklahoma Press.
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